O anúncio do Plano Brasil Soberano nesta quarta-feira (13/08) mostrou que o governo decidiu reagir ao tarifaço norte-americano com um arsenal de medidas emergenciais: R$ 30 bilhões em crédito via Fundo Garantidor de Exportações, prorrogação do drawback, ajustes no FGE, possibilidade de compras públicas de produtos que perderem mercado externo e exigências de conteúdo nacional para quem acessar as linhas de financiamento. É um pacote robusto no papel, mas que nasce com data para expirar em 2027, quando a reforma tributária — se não for adiada — promete eliminar os resíduos tributários nas exportações.
No próprio ato, o ministro Fernando Haddad deixou claro o cerne do problema: “Como a reforma tributária ainda não está em vigor, temos resíduo de impostos que são exportados e isso encarece a mercadoria. Se o exportador tem a garantia de receber parte disso como crédito tributário, ele consegue baratear o seu produto e enfrentar uma concorrência internacional mais acirrada.” A declaração evidencia um diagnóstico antigo: tributamos errado quem vende para fora e, ao invés de corrigir a estrutura, oferecemos um benefício temporário que serve apenas para tapar o buraco por dois anos.
O crédito tributário anunciado funcionará como uma antecipação parcial de valores. Até 2027, o governo tenta reduzir a pressão imediata de um cenário hostil, no qual os EUA impuseram tarifas de até 50% a produtos brasileiros, afetando diretamente setores como carne bovina, café, laticínios e manufaturados. No entanto, a medida não altera o custo estrutural de produzir e vender no Brasil.
De Cuiabá, onde participei da Expoecos 2025 com palestra sobre economia tributária no atacado e varejo, acompanhei também a reação de diversas entidades. A Acrimat, que representa os pecuaristas do estado, foi taxativa: o produtor já está pagando essa conta desde o anúncio do tarifaço, com perda de quase R$ 400 por boi abatido e prejuízo diário de US$ 12 milhões com a queda da arroba. Na nota divulgada no evento, a associação reforçou que qualquer compensação deveria começar pelo pecuarista, não por quem repassa custos adiante. “Não há sentido algum dar incentivo a quem já se preveniu repassando seus prováveis futuros prejuízos ao produtor que sempre paga a conta”, disse a entidade.
O impacto setorial é desigual. Grandes tradings e exportadores têm mais instrumentos para repassar custos ou ajustar contratos no mercado internacional. Já o produtor primário, especialmente na pecuária, enfrenta a perda direta de receita, sem margem para se proteger no curto prazo. A lógica da Acrimat é simples: se há R$ 30 bilhões para socorrer o setor exportador, que uma parte significativa desse valor vá para quem absorveu de imediato o golpe do tarifaço e hoje vê sua rentabilidade evaporar.
O crédito tributário, portanto, dá um sopro de fôlego, mas não é cura. É oxigênio de emergência para um paciente que segue no mesmo leito, com a cirurgia — a reforma tributária. Nesse intervalo, o risco é o de sempre: ou a medida expira antes de cumprir seu papel ou se eterniza, corroendo a lógica do sistema. O setor exportador agradece o gesto, mas sabe que respira por aparelhos — e que, no Brasil, o temporário raramente termina como planejado.
Eduardo Berbigier é advogado tributário especialista em agronegócio e Presidente da Berbigier Sociedade de Advogados.