Imunização dos animais é essencial para evitar casos da zoonose que gera perdas econômicas significativas aos criadores.
A raiva é uma doença silenciosa, mas letal, que pode afetar os equinos. Além de comprometer a saúde dos animais e causar perdas econômicas significativas aos criadores, a enfermidade representa uma ameaça constante à saúde pública, por se tratar de uma zoonose. Causada por um vírus do gênero Lyssavirus, da família Rhabdoviridae, a raiva acomete animais e humanos, ocorrendo globalmente, exceto em regiões onde foi erradicada, como Japão, Reino Unido, Nova Zelândia e Havaí.
Nos equinos, a principal forma de transmissão é a mordida de morcegos hematófagos infectados, sobretudo o Desmodus rotundus, amplamente distribuído na América Latina e responsável por grande parte dos surtos em herbívoros. Mordidas de carnívoros silvestres, como raposas e gambás, também podem ser fontes de infecção.
“Uma vez inoculado, o vírus replica-se no tecido local e alcança o sistema nervoso central por meio das fibras nervosas periféricas. A partir daí, desencadeia um processo progressivo e irreversível de destruição neuronal. O período de incubação é variável, podendo durar semanas ou meses, dependendo da proximidade do ferimento ao cérebro, da carga viral e da resposta imunológica do hospedeiro. Após atingir o sistema nervoso, o vírus dissemina-se centrifugamente, atingindo órgãos como as glândulas salivares, permitindo a transmissão a novos hospedeiros”, explica Camila Senna, médica-veterinária e coordenadora técnica de equinos da Ceva Saúde Animal.
Os sinais clínicos nos equinos são variados e frequentemente confundidos com outras doenças neurológicas, como encefalomielite viral, tétano ou intoxicações. Em geral, a doença apresenta uma fase excitativa, caracterizada por inquietação, ranger de dentes, olhar fixo, espumação oral, relinchos excessivos e até manifestações semelhantes a cólica severa. Posteriormente, evolui para a forma paralítica, mais comum nessa espécie, marcada por disfagia, fraqueza, claudicação, incoordenação, quedas frequentes e, em estágio avançado, decúbito, convulsões e paralisia terminal. A forma furiosa, embora mais conhecida em outras espécies, é rara nos equinos. Fotofobia, contrações musculares involuntárias e alterações súbitas de comportamento também podem ocorrer.
O diagnóstico in vivo é desafiador, mas fundamental diante da gravidade da doença. A ausência de histórico vacinal e a rápida evolução dos sintomas neurológicos devem sempre acender o alerta para a suspeita de raiva. O diagnóstico definitivo é realizado post-mortem, por análise do encéfalo e das glândulas salivares em laboratórios de referência, como o Instituto Pasteur em São Paulo, utilizando técnicas como a imunofluorescência direta, considerada padrão-ouro pela sensibilidade e rapidez. Por se tratar de uma zoonose de relevância em saúde pública, qualquer ocorrência é de notificação compulsória aos órgãos oficiais de vigilância sanitária.
Não existe tratamento eficaz; qualquer suporte apenas prolonga a progressão clínica, aumentando o risco de exposição para cuidadores e médicos-veterinários. O manejo adequado exige isolamento do animal suspeito e, em caso de contato humano, adoção imediata dos protocolos de profilaxia pós-exposição, que incluem vacinação e, em algumas situações, uso de soro antirrábico. A Organização Mundial da Saúde recomenda ainda que profissionais em contato frequente com equinos mantenham a imunização preventiva atualizada.
“A prevenção é a única medida realmente eficaz. O protocolo sanitário envolve vacinação anual de todos os animais sadios, imunização imediata de indivíduos recém-introduzidos no plantel e início da vacinação em potros a partir dos três meses de idade, com reforço posterior”, elucida a profissional. Além disso, medidas de controle populacional e monitoramento de colônias de morcegos hematófagos desempenham papel essencial, conduzidas por órgãos de saúde animal.
A raiva equina, além de causar perdas irreparáveis nos rebanhos, representa uma ameaça silenciosa à saúde pública. A conscientização sobre vacinação, biossegurança e notificação imediata de casos suspeitos é fundamental para reduzir a ocorrência da doença, proteger a produção e garantir a segurança de animais e pessoas.