As tarifas de importação de até 50% impostas pelos Estados Unidos sobre produtos brasileiros, em vigor desde 6 de agosto, têm gerado impactos significativos no mercado interno brasileiro. Alimentos como pescados, frutas, carnes e café, que possuem forte presença no mercado americano, estão sendo redirecionados para o consumo doméstico, o que pode aumentar a oferta e pressionar os preços para baixo no curto prazo.
No entanto, especialistas alertam para o risco de retração na produção e possível alta de preços a médio prazo. Rogério Marin, CEO da Tek Trade e presidente do Sindicato das Empresas de Comércio Exterior de Santa Catarina (Sinditrade), analisa as tendências e os desafios para o setor agropecuário brasileiro.
O setor de pescados, especialmente de tilápia, é um dos mais afetados pela medida, pois destinou cerca de 60% das exportações aos EUA em 2024 e movimentou aproximadamente US$ 240 milhões. Com as tarifas, empresas exportadoras de tilápia já registram queda de quase um terço nas exportações para os EUA. “A tilápia é perecível e o excedente precisa ser escoado rapidamente no mercado interno, o que deve reduzir os preços nos próximos meses”, explica Marin. Dados do IPCA-15 de julho apontam uma queda de 2,03% nos preços dos pescados, refletindo o aumento da oferta interna. Outros produtos, como camarão e lagosta, também enfrentam pressão semelhante, conforme o especialista.
No entanto, a médio prazo, a redução nas exportações pode levar a cortes na produção. A Associação Brasileira das Indústrias de Pescados estima que cerca de 20 mil empregos estão em risco devido à diminuição da demanda externa. Marin alerta: “A incapacidade de encontrar novos mercados rapidamente pode forçar empresas a reduzir a produção, o que elevaria os preços no futuro”.
Frutas: oferta elevada pressiona preços – As frutas, como manga, uva e açaí, também sofrem com o tarifaço. Em 2024, o Brasil exportou mais de 1 milhão de toneladas de frutas, com os EUA absorvendo uma parcela significativa, incluindo 77 mil toneladas de manga e uva. A Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frutas e Derivados (Abrafrutas) projeta uma redução de até 90% nessas exportações. No Vale do São Francisco, responsável por mais de 90% das exportações de manga e uva, o preço da manga tommy caiu 4% entre 14 e 18 de julho, atingindo R$ 1,36 por quilo, e pode chegar a R$ 0,30 se o excedente não for absorvido.
“A oferta interna elevada deve beneficiar o consumidor com preços mais baixos no curto prazo, especialmente para manga e uva, que registraram queda de 4,28% no IPCA-15 de julho”, observa Marin. O açaí, por ser um produto mais voltado ao mercado interno, deve sofrer menos impacto. Contudo, a perecibilidade das frutas limita estratégias de estocagem, e produtores podem enfrentar prejuízos se os preços caírem excessivamente.
Carne bovina: alívio temporário com incertezas – A carne bovina, com exportações de 532 mil toneladas para os EUA em 2024 (16,7% do total, equivalente a US$ 1,6 bilhão), enfrenta desafios significativos. A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec) estima uma perda de até US$ 1 bilhão em receitas anuais. Entre 24 de junho e 21 de julho, o preço da carne no atacado caiu 7,8%, e a arroba do boi gordo recuou 7,5%, tendência que deve chegar ao varejo entre agosto e setembro.
“No curto prazo, o consumidor verá preços mais acessíveis, já que frigoríficos como JBS e Minerva estão redirecionando a produção para o mercado interno ou para outros países, como Chile e China”, diz Marin. No entanto, ele alerta que, se a demanda internacional não for recomposta, os frigoríficos podem reduzir os abates, o que elevaria os preços a médio prazo. O IPCA-15 de julho registrou uma queda de 0,36% nos preços das carnes.
Café: estabilidade com risco de queda – Diferentemente de outros produtos, o café apresentou alta de 6,8% nas cotações em Nova York entre 14 e 17 de julho, devido à expectativa das tarifas, impactando o mercado interno, onde o preço da saca de 60 quilos subiu de R$ 1.602 para R$ 1.803. O Brasil, maior exportador global, enviou quase US$ 2 bilhões em café para os EUA em 2024, representando 16,7% das exportações do produto. Apesar disso, Marin projeta que, se o volume destinado aos EUA não for absorvido por outros mercados, os estoques internos podem crescer, pressionando os preços para baixo. “O café moído já registrou queda de 0,36% no IPCA-15 de julho, mas o comportamento futuro dependerá da capacidade de redirecionar as exportações”, explica.
Perspectivas e estratégias – O governo brasileiro, liderado pelo vice-presidente Geraldo Alckmin, busca novos mercados, como Angola, México, União Europeia e China, para mitigar os impactos do tarifaço. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, expressou otimismo sobre a possível isenção de tarifas para carne, café e pescados, destacando que 65% das exportações agrícolas já foram excluídas da taxação. Produtos como suco de laranja, petróleo e minério de ferro estão isentos, aliviando parte do setor agropecuário.
Marin enfatiza a necessidade de agilidade: “Redirecionar exportações exige tempo e adaptação a exigências sanitárias e logísticas de novos mercados. Enquanto isso, o consumidor brasileiro pode se beneficiar de preços mais baixos, mas deve se preparar para oscilações no segundo semestre e em 2026”. Ele destaca que a Tek Trade também está auxiliando empresas a explorar mercados alternativos, mas o processo é complexo e pode levar meses.
Fundada em 2005, a Tek Trade é uma empresa catarinense especializada em comércio exterior, e uma das fundadoras do Sinditrade. Com vasta experiência em operações de importação e exportação, a empresa oferece suporte a negócios internacionais de todos os tamanhos.