28 de julho de 2020

A ‘lenda’ Amarildo Merotti vai passar o bastão

O pecuarista, líder classista e criador da ‘Comercial da Roça’ completa três décadas de Mato Grosso e faz a sucessão da revenda com o filho até o fim do ano.

Mato Grosso é um ícone do Agronegócio do Brasil. Segundo maior estado produtor de grãos, planta soja, milho, algodão, madeira. É destaque na suinocultura e o primeiro em rebanho de bovinos. São mais de 30 milhões de bois e vacas. Abateu no ano passado 5,5 milhões de cabeças. Exporta para mais de cinquenta países. Até 2030, deve aumentar a produção de carne em 20%, utilizando 10% a menos de área. Até lá, o número de animais abatidos com menos de dois anos vai subir de 3% para 19%. Um exemplo de eficiência, tecnologia e produtividade, com resultados que melhoram a cada ano. “O produtor mato-grossense é focado. Temos clima, um Estado pujante, comida farta, regiões próprias para produzir e cada dia mais estaremos na frente. Com o avanço da Agropecuária moderna, vamos atrair mais clientes internacionais. Um monte de gente no mundo precisa comer. E temos alimentos para eles, desmatando cada vez menos”.

A opinião é do filho de pequenos produtores paulistas, meeiros plantadores de milho, nascido na pequena Santo Anastácio (SP), em 1966. Amarildo Merotti fala de uma realidade muito, mas muito diferente de quando ele pisou os pés pela primeira vez no Centro Oeste brasileiro. Ele ajudou os pais na roça quando era criança, formou-se Técnico Agrícola no Colégio Agrícola de Presidente Prudente (SP), conseguiu a carteira de motorista, pôs a mala nas costas e seguiu para Rondonópolis, para ‘ganhar a vida’. Para conseguir dinheiro, vendeu insumos agrícolas e comprou cabeças de gado para matadouros da região, antes de começar a criar seu próprio rebanho. Comprou algumas terras por lá no fim dos anos 1980, cada vez mais atraído pela região que começava a despontar como a nova fronteira da agricultura brasileira. E em primeiro de abril de 1993 abriu em Cáceres, na fronteira com a Bolívia, a revenda ‘Comercial da Roça’. No início, vendia e recebia em animais. Quando percebeu, tinha milhares de cabeças. E seguiu comprando terras. Começou a mexer com ração por incentivo de um amigo. A combinação das atividades de revendedor e pecuarista tornou-se uma fórmula vencedora. “E aprendi muito visitando propriedades. Todo tipo de ensinamento. As pessoas deveriam tirar um dia do mês para fazer visitas assim”, aconselha.

O crescimento foi vertiginoso. Mato Grosso passou a abrigar rapidamente o maior rebanho bovino do país e a fazenda de Merotti acompanhou esse desenvolvimento. “Quando percebi, tinha passado para mais de 4,5 mil hectares e rebanho de nove mil cabeças”, conta Merotti, falando da Fazenda Santo Antonio do Jauru, que emprega aproximadamente trinta colaboradores. Inicialmente, vendia animais a grandes empresas, com acesso aos matadouros. Por volta de 2005, iniciou uma cooperação com a BRF, uma das gigantes do Agro Brasil. “Devemos muito à indústria da carne porque ela organizou a cadeia produtiva e permitiu o nosso crescimento, facilitando a penetração em outros estados e países”, explica. A BRF e a JBS construíram frigoríficos espalhados por todo o estado e impulsionaram a construção da rede de estradas. O estado duplicou o rebanho bovino em duas décadas.

O pecuarista Amarildo diz que tem orgulho de ter desenvolvido um sistema de manejo com boas práticas que acaba redundando em lucro. “Na minha propriedade, o quesito principal para contratar um funcionário é ele tratar bem os animais. Não tem essa de moda antiga. Quem paga a conta são os animais. Temos que tratá-los da melhor maneira possível. No sistema de recria e engorda, conseguimos um animal para o abate com 30 meses e 21 arrobas. Quando você sabe o que está fazendo, sabe aonde quer chegar, fica fácil ganhar dinheiro. Com a fazenda nas mãos e conhecimento sobre o negócio e os investimentos, não tem como dar errado”, decreta.

A revenda foi na mesma toada e hoje se espalha em cinco mil m² de área construída, empregando 75 funcionários e alcançando uma participação de aproximadamente 5% do mercado de produtos veterinários de Mato Grosso. Quanto vende? Quantos clientes tem?  O Amarildo não conta, só dá pistas. “Comercializamos  1,5 milhão de doses de vacina na campanha nacional de prevenção da Febre Aftosa. Logo, atendemos clientes que atuam com um rebanho total de 1,5 milhão de cabeças”, calcula.

Com tanta experiência, o revendedor Amarildo examina um dos desafios da comercialização de insumos, cravando que o fim da vacinação compulsória contra a Febre Aftosa não deve ser visto como um drama pelas indústrias e revendas. “Pode até ser bem melhor para todos. A Aftosa nunca deu lucro para nós. É uma ferramenta que usamos para comercializar outros produtos durante a campanha. Mas isso acabou condicionando o produtor a fechar o animal só duas vezes no curral. Sem falar que no caso dos animais até dois anos é vacinado uma vez só. Quando o fazendeiro não tiver o compromisso oficial de levar o bovino, vai acabar manejando mais vezes o animal. Vai ficar mais fácil para vender. Uma oportunidade única do pecuarista fazer um bom e completo trabalho de imunização, programado minuciosamente por ele, adquirindo vacinas importantes para manter a qualidade da sanidade do seu plantel”, crava sem medo de ser feliz.

Ele lembra com saudade dos primeiros anos de lida na loja. “A revenda, naquela época, era muito diferente. Mas o que permanece é o rastro de suor que deixamos, de trabalho prestado, cliente satisfeito, amigos eternos. Quando eu abri a loja, tinha cliente que comprava vacina e me dava a caixa para eu usar de algum jeito. Era muita gente boa que eu atendia. Gostava de atender, sempre gostei do que fiz, reuni clientes, amigos e irmãos que me ajudaram muito no começo, quando tudo era mais difícil. E hoje ajudo muita gente porque são meus irmãos. Retribuo de alguma maneira porque estamos em uma posição privilegiada e é gratificante ter parceria com pessoas que fizeram a diferença para a gente”, conta satisfeito.

Mas o futuro não espera e o empreendedor de Santo Anastácio tem tarefa pela frente. Ele termina até o fim deste ano todo o processo de sucessão dos negócios comerciais. Um planejamento de cinco anos para passar o bastão da gestão para o filho André Merotti, engenheiro agrônomo que hoje comanda o departamento técnico-agronômico da Comercial da Roça. E o cunhado Marco Antonio Maciel Mendes, atual sócio. “Se precisarem de mim, daqui para frente, só para dar uns empurrões de vez em quando, morro acima”, brinca.

Marco está ao lado do Amarildo há vinte anos. “É um menino nota dez. Começou comigo quando era criança, foi office boy, trabalhou de saqueiro e hoje é meu braço direito e esquerdo juntos, o melhor vendedor que eu conheço”, conta. O filho, está na conta do serviço. “O André está totalmente preparado para tocar o negócio nos próximos anos, enfrentando todos os desafios”, reforça.

Mas, e o Amarildo empresário, produtor, político do setor, diretor da Acrimat (Associação dos Criadores de Mato Grosso), presidente de sindicato rural, especulado para cargos públicos? “Já fui bastante pressionado para entrar na política, mas só entrei na classista. É a segunda vez que estou na vice-presidência da Acrimat (Associação dos Criadores de Mato Grosso), já fui presidente de sindicato rural. Não ganho nada de dinheiro com isso, só gasto meu tempo. Mas o que faço é pela pecuária do estado”, justifica.

Ao olhar para o futuro da distribuição, ele prevê que em dez anos vai haver uma reviravolta muito grande. “Os sites vão evoluir bastante, a indústria vai querer vender direto para o consumidor. Só que ninguém consegue vender tudo para o consumidor final, ninguém tem estrutura para isso num país continental. Então, quem faz um bom trabalho, quem é sério, parceiro, paga suas contas em dia, vai sempre ter espaço”, garante. E admite que a venda eletrônica não é um problema, está ocorrendo em todos os setores, vai aparecer no atacado também. “A questão é que o produtor não pode esperar dois dias por alguns insumos. E não há como montar uma estrutura no país inteiro. Não há recursos para uma operação dessa magnitude. E para ele montar um site para vender e ter um em cada estado, não fica barato e até abre espaço para a gente também poder competir. Então, é como diz o ditado: O que faz o sapo pular é a necessidade”, brinca depois de opinar.

E é com mais otimismo ainda que a lenda caminha para passar o bastão de vez da ‘Comercial da Roça’ . “Penso que quem faz o que sabe não passa dificuldade. Logicamente, tem oportunistas no mercado, que acha que tudo é fácil. Mas, com o tempo, vai deixar espaço para quem tem vocação e sangue para isso. E a vocação tem que passar para as gerações. E estou conseguindo passar para o meu filho. Tomara que ele dê conta de sobreviver nesse segmento tão disputado. Mas confio bastante, até porque eu nunca vi ninguém dar errado se começou certo”, concluiu com o sorriso eterno que traz nos lábios.

 

 

 

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