Transparência e boas histórias

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Por Coriolano Xavier, Vice-Presidente de Comunicação do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Professor do Núcleo de Estudos do Agronegócio da ESPM.

Três meses e três potentes torpedos impactaram a percepção dos consumidores em relação ao mercado de carne. Primeiro, em meados de março, foi o impacto da “operação carne fraca” (razoavelmente bem arrefecido em curto tempo). Depois, foi a vez da delação premiada dos irmãos Batista, que também impactou esse mercado, pois eles representam o maior grupo empresarial de proteína animal do planeta. Por fim, veio a proibição das importações de carne bovina brasileira in natura, pelos Estados Unidos, por conta de questões sanitárias. Que balanço se pode fazer agora, pensando no comportamento do consumidor, estratégias de marketing e defesa do setor?

As pessoas vão parar de comer carne? Claro que não. Mas a tendência é acontecer alguma movimentação no mercado, em função desses episódios. Por exemplo: em pesquisa divulgada em maio¹ e realizada antes da bomba da delação, 37% das pessoas disseram ter reduzido em algum grau o seu consumo de carne, no período imediatamente posterior à divulgação da “carne fraca”. Uma fatia menor, de 7%, afirmou ter parado de consumir e 16% informaram ter trocado de marca. São movimentações de mercado normais, algumas temporais, diante de impactos na confiabilidade de marcas ou categorias de produtos. No mundo de hoje multimidiático, não poderia ser diferente.

Para além dos aspectos racionais que decidem a compra dos alimentos (qualidade, segurança, nutrição), ou dos clássicos quesitos de preço e sabor, a alimentação é uma sensação e um sentimento pessoal, o que confere ao alimento uma dimensão emocional de compra muito forte. Alimentação é sobrevivência; damos alimentos a nossas crianças, por exemplo. Alimento também é saúde. Também é um dado sociocultural extremamente relevante e está presente em celebrações e tradições culturais de todo o tipo, aqui no Brasil e no mundo inteiro. Por isso, existe um fio condutor essencial, e de natureza emocional, na percepção dos alimentos, que é a confiança. Quebrar esse elo significa romper um padrão decisório de compra e isso pode estar acontecendo agora, em alguma medida.

Quando cresce o grau de ceticismo em um mercado, abrem-se oportunidades para mobilidade entre categorias e marcas. Na semana da delação dos Batista, por exemplo, observou-se aumento de R$ 2,5 bilhões no valor da BRF (uma concorrente), depois de dois anos de queda, em que seu valor recuou mais de R$ 20 bilhões. Em tese, essa marca pode ter agora uma chance para retomar parte da participação de mercado que perdeu nos últimos três anos. Por outro lado, o gigante brasileiro da carne (JBS) tende a adotar uma atitude menos agressiva em marketing e mais conservadora em finanças, abrindo um flanco para os competidores, principalmente no pequeno varejo, que em geral trabalha com apenas duas marcas.

Hora boa, por exemplo, para a emergência de frigoríficos menores, ou de qualidade diferenciada, no mercado de carne bovina. O mesmo vale para a carne suína fresca, setor que vem fazendo um trabalho mercadológico notável, para mudança de conceito entre os consumidores, e pode ter agora um impulso extra. Uma coisa, entretanto, precisa ficar clara: para aproveitar essas oportunidades é essencial explosão e agilidade de distribuição, qualidade e, principalmente, dois fatores chave na gestão de produtos em mercados com crise de confiabilidade: transparência nas ações e uma narrativa de marketing forte.

Se o desafio for todo um setor – seja a carne ou outros alimentos – lembro aqui o depoimento de uma mãe, durante uma pesquisa, falando algo mais ou menos assim: “se tem notícia de um problema e não entendo direito, paro de consumir até ver que tudo bem; com dúvida, não vou dar para meu filho”. De novo àqueles dois pontos chave: ser transparente e contar boas histórias. O importante a essa altura é não se perder a perspectiva evolutiva do setor, pois há pecuaristas, suinocultores e avicultores desenvolvendo um excepcional trabalho em eficiência zootécnica, produção sustentável, segurança do produto e marketing responsável. Eles são futuro. Padrões de referência para construir uma ponte com a sociedade e os consumidores.

(1)     “Efeito Carne Fraca”, Revista Exame, ed. 1.138, pesquisa Dunnhumby.

Sobre o CCAS

O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto. 

O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico. 

Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas. 

A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: http://agriculturasustentavel.org.br/. Acompanhe também o CCAS no Facebook: http://www.facebook.com/agriculturasustentavel

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