A Athenagro estima que, em 2018, a degradação das pastagens tenha custado aos pecuaristas o equivalente a R$7,23/@ produzida, recursos que foram dedicados a reformar as áreas em estágio avançado de degradação. Chegamos a esta estimativa cruzando as conclusões da avaliação da qualidade das pastagens, via Rally da Pecuária, e o dimensionamento do montante financeiro da cadeia produtiva da pecuária, um outro estudo anual conduzido pela empresa. E as perdas não param por aí. Como os recursos não são suficientes para reverter a totalidade do processo de degradação, outros R$5,74/@ são perdidos sem que haja condições para reverter esse quadro, implicando em perda direta do patrimônio. Trata-se do montante que alimenta a área que vai sendo regenerada, conforme explicado no texto “A evolução da área de pastagens no Brasil”, publicado no dia 3 de abril no site do Rally da Pecuária. No referido texto, do total de 162,5 milhões de hectares, classificamos 136,8 milhões como pastagens exclusivas (não integradas) em bom estado. A expressão “bom estado” pode causar estranheza, mas é parte da metodologia adotada na Athenagro. Consideramos assim aqueles pastos que não demandam imediata intervenção para recuperação ou reforma. Ou seja, ainda não atingiram o estágio avançado de degradação, como estão os 13,9 milhões de hectares que precisam urgentemente de reforma ou recuperação. No entanto, não significa que estejam em ótimas condições. Naqueles 136,8 milhões de hectares, a Athenagro estima 8,4 milhões de hectares que precisarão de recuperação dentro dos próximos 12 meses. Há ainda outros 49,5 milhões de hectares que chegarão nesse estágio entre 12 e 36 meses. São áreas em degradação que piorarão lentamente à medida que não recebem nenhum tratamento para reverter tais condições. Vale lembrar que parte considerável dessas pastagens receberá algum tratamento, mesmo que não seja o mais adequado do ponto de vista técnico e econômico. Caso contrário, o montante de área perdida seria bem maior do que é hoje.
Aprofundando nas análises, chega-se a conclusões próximas das divulgadas pelas pesquisas da Embrapa e de outros centros de estudos. Cerca de 70% das áreas de pastagens do Brasil apresentam algum nível de degradação. No entanto, o que nos interessa como empresa de consultoria é qualificar essa degradação. Dependendo do estágio do processo e da forma como ocorre, as decisões dos produtores devem ser diferentes. É assim que eles e os técnicos poderão avaliar o critério de intervenção, que pode ser manutenção, reforma ou recuperação. Se a intervenção começar de forma preventiva, antes que o pasto atinja o estágio de demanda imediata por intervenção, o produtor colherá o melhor benefício/custo no uso de recursos para recuperar a qualidade das pastagens. É por essa razão que as áreas nessas condições são classificadas, internamente, como exclusivas em bom estado. Essa metodologia, no entanto, é falha com relação às pastagens nativas. No caso dos pampas, por exemplo, seria preciso quantificar a área de campo natural invadido por capim Anoni, uma invasora de difícil manejo que atualmente ameaça a pecuária gaúcha. A metodologia que adotamos ainda não nos permite fazer tal separação. A importância de adotar acertadamente as estratégias de manejo é fundamental para que os produtores obtenham sucesso financeiro. A campo, identificamos no Rally da Pecuária entre 3% e 5% das áreas necessitando efetivamente de reforma. Outros 10% a 16% poderiam ser recuperados com adoção de insumos aplicados em superfície. A vantagem dessa estratégia é o custo, em torno de 50% a 65% do total de uma reforma completa. A recuperação envolve o controle das invasoras e a correção e adubação do solo, possibilitando condições para que o pasto se recupere. A reforma envolve todas as operações de reinstalação das pastagens, incluindo revolvimento do solo, sementes e outros insumos necessários. Quanto menor o pacote tecnológico, menos tempo irão durar as pastagens.
Em entrevistas no Rally, pecuaristas indicam que reformam ou gostariam de reformar entre 7% e 10% de suas áreas. Os técnicos de campo, por sua vez, jugam necessários reformar 26% da área total de pastagens.
Observe que, mesmo não sendo sua especialidade, os técnicos de campo são efetivos em diagnosticar a necessidade de intervenção nas pastagens. No entanto, pecam na decisão de como deverá ser feita essa intervenção. É fato que 25% a 30% das pastagens precisam de intervenção, mas apenas 3% a 5% precisam ser, realmente, reformadas. Sem dúvida alguma, os conhecimentos já consolidados em torno do manejo e tratamento das pastagens brasileiras tropicais ainda são pouco difundidos no campo. No público do Rally, apenas 8,5% dos técnicos trabalham em atividades em que se espera bons conhecimentos em pastagens.
IMPACTO DA DEGRADAÇÃO DAS PASTAGENS A OPORTUNIDADE DE ADOTAR ESTRATÉGIAS PARA REVERSÃO – Em novembro de 2018, publicamos um artigo na edição “Especial Pastagens”, da revista DBO Rural. O texto explorou o impacto da degradação das pastagens e as oportunidades para os produtores adotarem estratégias que possibilitem reverter o processo. Não é exagero afirmar que a degradação dos pastos representa o maior gargalo financeiro da pecuária brasileira. Mesmo não sendo o item de maior relevância no custo de produção, seus efeitos indiretos limitam a capacidade produtiva do sistema, resultando em consequências econômicas negativas. Com a capacidade de suporte comprometida, a propriedade movimentará menores quantidades de animais em relação ao seu potencial. Assim, uma estrutura dimensionada para atender cerca de 2,5 mil cabeças acabará sendo administrada com apenas 700 a 1.500 cabeças, por exemplo. As vendas para ratear os diversos custos dessa estrutura serão proporcionais ao tamanho limitado do rebanho. O efeito da degradação, portanto, causa aumento na participação dos custos fixos e indiretos em cada arroba produzida, até mesmo nos itens que teoricamente não se relacionam com a degradação, como é o caso da folha de pagamento.
Diretamente, o custo da degradação incide nas operações de reforma ou recuperação. De maneira prática, o cálculo é obtido pelo custo da reforma do pasto dividido pelo número de anos que esse pasto levará para ser reformado novamente. Ambas as informações devem ser levantadas conforme a realidade de cada fazenda. Em nossas análises, já identificamos pastos sendo reformados ao custo médio de R$ 1.200 até R$ 3.900 por hectare. A variação ocorre de acordo com a região, qualidade do solo e pacote tecnológico definido pelo produtor. O tempo de duração dos pastos também varia conforme a estratégia das fazendas. Há casos de reformas a cada 3 anos e outros em que as pastagens são usadas por mais de 30 anos. Nessa análise, são desconsideradas as fazendas que operam com integração lavoura e pecuária, sistemas que preconizam a reforma frequente das áreas que serão cultivadas. Dentre o público entrevistado pelo Rally da Pecuária em 2018, a média de duração das pastagens está por volta dos 9 anos. Nas edições de 2011 a 2014, essa média era de 6,5 anos de duração, indício de que esteja ocorrendo algum avanço no manejo. Pela metodologia que adotamos, qualquer insumo – sejam defensivos, corretivos ou fertilizantes – aplicado em superfície será computado como custo de produção no orçamento anual e não como depreciação de investimentos. Quanto melhor for o trato cultural do pasto no sistema de produção, maior será a durabilidade e a capacidade de suporte. Consequentemente, menor será o custo da depreciação por arroba produzida. Segundo os indicadores acompanhados pela Athenagro, a participação da degradação das pastagens nos custos de produção é por volta de 20% nos sistemas menos produtivos, e tende a zero nos sistemas mais produtivos, situação em que as mesmas se perenizam.
Em uma propriedade cujas pastagens são conduzidas adequadamente, o orçamento anual com insumos agrícolas é alto. De fato, porque, nessas condições, a fazenda irá gastar muito mais por hectare, assumindo despesas consideravelmente superiores ao que normalmente se encontra na média. O ganho financeiro, no entanto, virá da quantidade de arrobas que serão produzidas e vendidas por hectare.
Em um exercício elaborado a partir da realidade de campo, consideramos que as fazendas que manejam as pastagens com alta tecnologia poderiam produzir cerca de 12@/ha/ano, enquanto em uma situação de pastos em avançado estágio de degradação, a produção se limitaria a menos de 3@/ha/ano.
Importante ressaltar que o cenário ilustrado na figura 4 é conservador. Ou seja, a produtividade dos pastos mais degradados está superestimada, enquanto a do pasto de qualidade 5, na melhor condição, está subestimada. Ainda são necessárias duas considerações sobre os dados expostos na figura 4. Não analisamos a inserção de adubações intensivas, com altas doses de nitrogênio em equilíbrio com os demais nutrientes, conforme a análise de solo. Foram consideradas apenas adubações de manutenção, aplicadas em maiores proporções das áreas à medida que se caminha no sentido dos pastos de melhor qualidade. O cálculo da produtividade também não envolveu nenhuma estratégia de nutrição mais sofisticada. Toda a análise baseou-se apenas em fornecimento de mineralização comum, adotando produtos da chamada linha branca. O objetivo não é sugerir um sistema de produção, mas sim isolar e analisar o impacto econômico de um bom manejo das pastagens. Dando sequência à análise, foram comparados os custos por hectare e a diferença entre a receita esperada e o orçamento anual destinado ao pasto, para cada situação. Nos sistemas de menor tecnologia, o custo é a própria depreciação, ou seja, o valor da reforma dividido pelo número de anos em uso. Nos de maior tecnologia, o desembolso é anual, com manutenção da fertilidade do solo e controle programático de invasoras e insetos.
Independentemente da estratégia, os custos das pastagens oscilam entre R$ 250 e R$ 350 por hectare/ano. No entanto, na baixa tecnologia, o produtor contará com apenas 3@ a 5@ por hectare para pagar todas as contas. A receita, depois de descontado o custo do pasto, será de R$ 60 a R$ 270 por hectare, recurso que ainda precisará bancar todas as demais despesas, incluindo funcionários, nutrição, manutenções, sanidade, máquinas etc. Constata-se, portanto, a inviabilidade econômica de uma propriedade com elevada proporção de pastos em estágio avançado de degradação. Nas situações de tecnologias mais elevadas, os mesmos custos dedicados às pastagens serão sustentados por vendas de 8@ a 12,5@, permitindo uma receita descontada entre R$ 840 a R$ 1.300 por hectare/ano. Considerou-se cerca de R$ 136/@ no ciclo completo, aplicando média ponderada entre preços de vendas de machos e fêmeas. Eliminando os gargalos provocados pela degradação, os produtores terão recursos disponíveis para galgar novos saltos tecnológicos em outras dimensões da produção. É o exemplo das estratégias nutricionais, envolvendo produtos mais sofisticados e as diversas opções de inserção de grãos ou concentrados na dieta. A produtividade crescente possibilitará ganhos ainda mais expressivos, abrindo espaço para intensificação de parte da área e crescimento vertical do sistema produtivo. E o mais interessante é que o recurso financeiro para iniciar o processo está disponível na própria fazenda. Estimativas apresentadas nos relatórios do Rally da Pecuária indicam que o simples diagnóstico e adoção adequada da estratégia, para definir entre reforma ou recuperação das pastagens, possibilitaria eliminar os pastos de qualidade 2 e os degradados em apenas dois a três anos, com os mesmos recursos que o produtor já disponibiliza. A partir do terceiro ano, ainda sem colocar dinheiro de fora, as pastagens de qualidade 3 e 4 começariam a caminhar no sentido da qualidade 5, revertendo o processo de degradação. O investimento demandado estaria restrito ao aumento do rebanho, dada a necessidade de se adequar à nova situação. Não se passa de um nível de tecnologia para outro sem que se invista.
O sucesso do processo depende da aplicação rigorosa da tecnologia e do aprimoramento da capacidade gerencial. É fundamental considerar que sistemas mais tecnificados demandam maior complexidade administrativa, além de aumentar a exposição a riscos climáticos e de mercado. Sem os devidos cuidados, a expectativa de gerar lucro em escala pode acabar transformando-se em prejuízos também em escala. A melhoria do resultado econômico com o aporte tecnológico é inquestionável, desde que seja implementado com o devido rigor.
* Maurício Palma Nogueira, sócio e diretor da Athenagro, é engenheiro agrônomo pela Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz”/USP, com especialização em administração rural. É consultor desde 1998 acompanhando empresas e analisando cenários e resultados financeiros nas cadeias produtivas de proteína animal. Planejou a metodologia e coordena Rally da Pecuária. É autor/coautor de diversos livros, capítulos e artigos sobre economia, conjuntura pecuária, viabilidade de aumento no pacote tecnológico, mercado e tendências no agronegócio. Em 2015, 2016 , 2017 e 2018 foi considerado uma das 100 personalidades mais influentes do Agronegócio, segundo a Revista Dinheiro Rural. Em 2018, recebeu da AEASP (Associação dos Engenheiros Agrônomos do Estado de São Paulo) a Medalha Fernando Costa, destaque na área de Iniciativa Privada.