Indústria precisa investir na resiliência climática para mitigar riscos e prejuízos

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Os desastres climáticos aumentaram no Brasil nos últimos anos e cresceram em 250% no período de 2020 a 2023 em comparação com a década de 1990, segundo estudo da Aliança Brasileira pela Cultura Oceânica, coordenada pelo Programa Maré de Ciência da Universidade Federal de São Paulo, pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação e pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), em parceria com a Fundação Grupo Boticário.

O estudo aponta que ocorreram no Brasil 6.523 desastres climáticos na década de 1990 e no período de 2020 a 2023 esse número subiu para 16.306. O aumento dos desastres climáticos reforça a importância de o setor produtivo investir na resiliência climática para reduzir riscos à sua infraestrutura e produção.  Segundo o estudo Panorama dos Desastres no Brasil, da Confederação Nacional de Municípios (CNM), no período de janeiro de 2013 a dezembro de 2024, desastres de origem natural e de origem tecnológica geraram prejuízos de R$ 732,2 bilhões no Brasil. Os eventos de causas naturais foram os maiores responsáveis pelos prejuízos. A seca e a estiagem geraram perdas de R$ 413,2 bilhões e o excesso de chuvas gerou um prejuízo de R$ 215 bilhões, no período analisado.

Um exemplo recente do impacto dos desastres naturais na economia foram as enchentes no Rio Grande do Sul de 2024. O Boletim regional do Banco Central do Brasil, lançado neste ano, analisou os Impactos das enchentes de maio na atividade econômica e no mercado de trabalho do RS. Segundo a publicação, se for desconsiderada a participação da agropecuária, que mitigou suas perdas por ter colhido boa parte da safra de verão e não ter iniciado o plantio da safra de inverno quando as enchentes atingiram o estado, o Índice de Atividade Econômica Regional do Rio Grande do Sul cresceu 2,7% em 2024, abaixo da média de 3,8% dos demais estados brasileiros.

A indústria de transformação foi o setor mais afetado no primeiro momento. Em maio, a produção industrial caiu 26,4% em relação a abril. A contração decorreu da paralisação total ou parcial de diversas unidades produtivas e dos danos à infraestrutura logística. No acumulado do ano, a indústria de transformação do Rio Grande do Sul cresceu 0,6%, abaixo da média de 3,9% dos demais estados.

Processos estáveis demandam resiliência climática – Entre os setores que formam a indústria de transformação do Rio Grande do Sul, a mais afetada, no primeiro momento, foi a indústria química, que teve uma queda de 59,2% no mês de maio em relação a abril e recuperação de 156,6% em junho. O estado é responsável por 11,2% da produção nacional de químicos, segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), e abriga o Polo Petroquímico do Sul, na cidade de Triunfo, a 52 quilômetros de Porto Alegre.

A rápida recuperação do setor mostra a importância da resiliência climática. As empresas do Polo conseguiram fazer uma paralização programada de suas atividades quando as enchentes impactavam o acesso de colaboradores e de matéria-prima. A paralização programada é uma atividade complexa que pode demandar até três vezes mais colaboradores do que durante o processo de produção e é importante para manter a segurança das instalações, dos colaboradores e da comunidade do entorno, além de possibilitar retomar a produção, mitigando qualquer risco.

A indústria química precisa investir na resiliência climática de plantas produtivas e áreas de armazenagem, pois além de todos os problemas que uma enchente causa em qualquer atividade produtiva, muitos insumos do setor são sensíveis e podem sofrer alterações devido a mudanças bruscas de temperatura ou contato com a água.

Um ambiente que proporcione processos produtivos estáveis demanda constantes investimentos na realização de avaliações de impactos dos riscos climáticos e por consequência na resiliência das infraestruturas das plantas industriais e áreas de armazenagem, além de investimentos em veículos especializados para o transporte e no estudo de rotas logísticas mais seguras.

Outros fatores que levaram a indústria química a aumentar sua resiliência climática é o uso intensivo de água e energia no processo produtivo. Reduzir a dependência do fornecimento de água e energia é fundamental para o setor aumentar sua sustentabilidade, reduzir custos produtivos e manter o máximo de autonomia em cenários de crise causados por desastres climáticos. Atualmente é comum as plantas industriais terem sistemas para captar e reutilizar a água das chuvas e a geração de energia por meio do reaproveitamento de subprodutos, uso do vapor gerado no processo produtivo ou captação de energia solar.

Adaptação constante – Conforme a indústria química investe no desenvolvimento de produtos com matéria-prima de base renovável o setor aumenta sua exposição a riscos relacionados aos eventos climáticos extremos “no lado de fora do portão”. Os riscos de quebras de safra obrigam o setor a homologar e desenvolver processos produtivos que usem biomassas, subprodutos de diferentes tipos de cultivos como soja, arroz, milho, mamona e canola, para reduzir riscos de falta de matéria-prima.

O relatório Economic of Adaptation, do Banco Mundial, estima um prejuízo anual global entre US$ 77,6 bilhões e US$ 89,6 bilhões, resultante dos eventos extremos até 2050. Conforme esses eventos oriundos das mudanças climáticas estão mais constantes e afetam o ambiente de negócios, como a indústria química está na base da cadeia produtiva aumenta a importância de o setor desenvolver novos processos e produtos mais sustentáveis, que reduzam suas emissões e de seus clientes.

Investir na resiliência climática também é fundamental para o controle de custos. Além dos prejuízos relacionados a danos à estrutura, paralização de plantas produtivas, outra consequência é o aumento de custos com apólices de seguros e nem sempre os prejuízos são ressarcidos. Segundo o relatório “Weather, Climate & Catastrophe Insight: 2019 Annual Report”, da seguradora AON, de 409 desastres naturais, que resultaram em perdas econômicas de US$ 232 bilhões, apenas US$ 71 bilhões foram cobertos pelas seguradoras.

O gerenciamento do risco climático é fundamental no planejamento das empresas, independente do tamanho e sua área de atuação. As experiências e ações desenvolvidas pela indústria química podem ajudar outros setores a entenderem a importância de analisar os riscos associados aos eventos climáticos extremos, reduzir sua exposição e desenvolver soluções para amenizar paralizações e dificuldades na retomada da produção.

 

Wander Pascini da Silveira é Head de Desenvolvimento Técnico do Grupo Flexível.

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