26 de setembro de 2021

Como o conforto das vacas na transição promove produtividade de leite

A gestão do conforto para uma maior produtividade e longevidade, depende da interação entre o ambiente físico (cama, área de alimentação, etc.) com o ambiente social (agrupamento, lotação, competição, espaço de cocho, etc.). Em conjunto irão definir o ambiente alimentar. A boa gestão desses ambientes influencia no comportamento e na gestão do tempo por parte da vaca, por exemplo, se houver privação para a vaca descansar o efeito será negativo sobre a produtividade e saúde dos cascos.

Em última análise, um ambiente ótimo combinado com uma nutrição adequada irá assegurar que as necessidades de conforto e bem-estar, sejam satisfeitas com mais IMS, resultando numa maior produtividade e saúde. Já a integração dos mecanismos fisiológicos, como enchimento ruminal, que controlam a ingestão de alimentos, além do ambiente físico e social, exerce um efeito modulador tremendamente poderoso sobre o comportamento e desempenho da vaca.

Um ponto central para qualquer discussão sobre os requisitos de alojamento para vacas leiteiras é a compreensão de seu comportamento social, e o desafio de movimentação entre os lotes e os efeitos de lotação especialmente no período de transição. Com a intensificação dos sistemas de produção, houve uma mudança no estilo de vida da vaca leiteira, e nesse sentido para melhorar a saúde e o bem-estar do gado leiteiro, deve-se prover as necessidades básicas de cada vaca para que assim, ela possa se comportar como um animal a pasto, ou seja, comendo e descansando com o rebanho e socializando de forma natural.

Tradicionalmente para manejo de vacas em transição (pré e pós parto), as vacas secas são movidas para um grupo de pré parto 21 dias antes do parto previsto e, em alguns casos, movimenta-se a vaca cerca de 3 dia antes do parto previsto ou até mesmo no momento em que a vaca ou novilha iniciam o trabalho de parição. Após o nascimento do bezerro ela é movida para um lote de vacas em lactação, de forma que ficarão separadas por um período de 2 a 3 dias até que todo o colostro seja ordenhado. Após esse momento, elas são encaminhadas para um ambiente de pós-parto por um período de 14 a 21 dias e, em seguida, para um lote de alta produção leiteira. Estratégias como esta, contemplam cinco movimentações em um período de menor a 5 semanas, ou seja, espaço diferente, outras companheiras de rebanho, dietas também diferentes, etc.

A movimentação dos animais entre os grupos provoca um aumento na interação social, além de um período de stress social até que se desenvolva uma hierarquia e haja estabilidade social. Esse período deve-se concretizar cerca de 3 a 7 dias. Com isso, o comportamento mais frequente observado são empurrões e evasão de espaço, especialmente no cocho de alimentação e área de descanso, o que poderá afetar diretamente a produção de leite.

As vacas primíparas são geralmente subordinadas às vacas multíparas, e diversos estudos apresentam a diferença de comportamento e produção de leite, quando estas categorias são avaliadas de forma separada e, ou, juntas. Para citar um estudo, (Rick Grant and Albrite,1997) as primíparas quando separadas aumentam o tempo no cocho comendo uma diferença de 184min. versus 205 min., também apresentam maior tempo de descanso (+ 40min.) e, maior produção de leite (aproximadamente +10%).

Outra gestão de manejo que irá afetar o comportamento dos animais, é a densidade de lotação.Quando estão lotados, ou seja, maior número de vacas que camas, no caso de free stall, ou maior densidade por m2, no caso de compost barn, a tensão social aumenta. Os animais passam mais tempo andando, mais tempo em pé e em caso de free stall, ficam deitadas fora das baias, o que ocasiona maior resposta do cortisol indicando maior nível de stress, mais lesão de cascos, etc.

Este mesmo excesso de densidade ou lotação também irá impactar negativamente no caso do espaço de cocho da alimentação. Como avaliado pelos etólogos,  o gado é alelo mimético, o que significa que eles gostam de realizar a mesma atividade ao mesmo tempo, dessa forma, o comportamento de repouso, comer, beber e outras atividades. E, o excesso de lotação, por definição, frustra o comportamento alelo mimético.

Em um estudo do G. Oetzel, 2003, demonstrou que para cada aumento de 10% na taxa de lotação acima de 80% no lote pós-parto, houve redução na produção de leite de 0,73 kg por dia. Portanto, o risco de queda na ingestão após movimentação dos animais entre lotes e competição devido a superlotação, podem muito bem ser os principais determinantes do sucesso das vacas de transição.

Vale lembrar também que as vacas em período pré-parto são mais largas, e isso precisa ser levado em consideração, quando olhamos para a oferta de cama e espaço de cocho para essa categoria. A recomendação em relação a densidade populacional em caso de compost barn é de 15m² a 18m² por vaca; e em caso de largura da cama em sistema de free stall deve ser de 1,27 a 1,30m de largura. Quanto ao espaço de cocho é recomendado 0,8m a 1 m/vaca.

Em resumo, a gestão do manejo e ambiente (instalações) da vaca influencia a sua capacidade de praticar os seus comportamentos naturais. Sabemos que a movimentação dos animais entre grupos é inevitável, no entanto, sugerimos que o número de movimentos seja o mais limitado possível. Geralmente a recomendação seria um lote de vacas secas subdividido em dois grupos: da secagem até 21d pré-parto (d-60 ao d-21) e 21 dias antes até o parto (d-21 ao d0), onde as vacas são expostas a uma dieta aniônica nos últimos 21 dias antes parto.

Há determinadas propriedades em que a medida que o parto se torna iminente a vaca é movimentada para uma baia de parição, porém é algo difícil de gerenciar o momento exato, e na grande maioria das vezes as ocorrências como retenção de placenta e metrite acabam se agravando nessa situação. Uma estratégia de gerenciamento de parto que está encontrando preferência, é mover a vaca para um local apropriado de parto quando os pés do bezerro começam a aparecer. Essa prática apresenta algumas desvantagens como a necessidade de um monitoramento mais frequente do lote e também pode interromper o processo de parto, particularmente em novilhas.

Uma vez que a bezerra nasce e a vaca volta a se levantar ela é transferida para o lote pós-parto e a bezerra é levada para o alojamento neonatal. Com essas estratégias alternativas, a vaca pode prosseguir através do período de transição com menos troca de lote. No entanto, a instalação deve ser bem projetada e bem manejada.

Cito aqui alguns pontos críticos para se ter sucesso na fase de pré-parto:

O gerenciamento e a higiene da cama e do local do pré-parto devem ser excelentes, necessitando o suprimento abundante de material limpo e seco da cama, para um repouso confortável.

O lote  de pré-parto deve ser verificado com frequência por uma pessoa bem treinada de hora em hora, 24 horas por dia de modo que se for necessário intervenção ao parto se torne mais ágil e fácil de se realizar o auxílio.

Respeitar o limite de lotação tanto em relação à cama como no espaço de cocho.

Prover conforto térmico.

Dieta específica para cada fase do período em que a vaca se encontra.

Separar vacas de novilhas.

Com relação especificamente de instalação em termos de layout e design é preciso uma melhor compreensão de cada realidade da propriedade e os custos envolvidos no projeto, de forma que sejam compensadas por uma melhor produção de leite, saúde e longevidade. A intenção deste artigo não é defender nenhum dos sistemas de produção, e nenhum tipo específico de construção. Todos os sistemas podem ser eficientes desde que realizados com critérios técnicos e de bom senso. De forma geral os objetivos das instalações são permitir uma exploração racional com a viabilidade econômica e viabilidade gerencial, proporcionar aos animais condições para exteriorizar todo seu potencial genético, aumentar  a eficiência do uso da mão de obra e proteger de alguma adversidade climática.

Como dica eu cito alguns recursos a serem avaliados:

  1. Qual o tamanho do rebanho atual e qual a projeção deste rebanho?

  2. Onde eu quero e posso chegar? Tenho recurso financeiro? Tenho área suficiente para plantio das forrageiras?

  3. Existe água suficiente para atender a demanda de todo o rebanho? Tenho planos para irrigação? Manejo de dejetos, etc.?

  4. Tenho energia suficiente para “tocar” os equipamentos? Preciso de um gerador?

  5. A topografia é adequada para adequar ao projeto proposto?

  6. O local da instalação ficará próximo ao sistema de ordenha,?

Lembre-se, decisões repercutem a longo prazo!!

Para concluir, talvez o resultado final mais importante de um ambiente adequado para vacas no período de transição é uma melhoria no bem-estar animal. Isso resulta em uma melhor imagem para o setor, maior confiança do consumidor na qualidade e segurança do produto final (leite) e uma atividade mais próspera para o produtor.

Neto Carvalho é Consultor técnico da Cargill Nutrição Animal.

 

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