A importância da avaliação qualificada das Políticas Públicas Agropecuárias

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luis rangel

O Brasil possui um vasto histórico de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento rural, buscando impulsionar a produção agropecuária de maneira sustentável. No entanto, a avaliação dessas políticas muitas vezes é negligenciada, comprometendo a eficiência dos programas e dificultando a correção de distorções. Entre eles estão, o Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PLANAPO), lançado em 2013, concretização da Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica (PNAPO) e o Programa de Bioinsumos (PNB), cujas análises ex-post revelaram desafios e limitações que podem servir de aprendizado para outras iniciativas.

Criado em 2020, o PNB surgiu como uma política pública, dita inovadora, para fomentar o uso de bioinsumos na agropecuária, reduzindo a dependência de insumos químicos convencionais. A promessa era alavancar a produção sustentável e fortalecer a bioeconomia no Brasil. Mas essa proposta se assemelha muitíssimo aquela apresentada pelo PLANAPO em 2013. Entretanto, análises preliminares revelam que o impacto direto do programa foi limitado ou quase nulo, uma vez que a adoção de bioinsumos esteve mais associada a fatores econômicos estruturais (aumento do valor da produção e busca pela redução de custos) do que às diretrizes da política.

Dentre os problemas identificados, destaca-se a falta de bases de dados confiáveis que permitam uma avaliação robusta dos efeitos do programa. A inexistência de informações precisas prejudica a formulação de novas estratégias e pode comprometer a efetividade da política no longo prazo. Outro ponto crítico é a forte concentração do mercado de bioinsumos em poucas espécies de agentes biológicos. Existem poucas empresas com muitos produtos enquanto a maioria das empresas registrantes possuem apenas um produto. Isso, sem dúvida, é um viés que dificulta a ampliação da concorrência e o acesso dos produtores rurais a esses insumos.

A experiência com o Bioinsumos, desde sua origem no Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PLANAPO, ressalta a importância de um monitoramento contínuo e uma avaliação qualificada das políticas públicas rurais. Políticas bem-intencionadas, mas sem uma análise rigorosa de seus impactos e execução, correm o risco de se tornarem meras declarações de intenção, sem efeito prático.

Entretanto, podemos dedicar à política de bioinsumos, parte do mérito da publicação da Lei 15.070 de 23 de dezembro de 2024. A mobilização para feita a partir da necessidade de separar os produtos químicos convencionais daqueles inovadores, vindos de origem biológica, surtiu um efeito impressionante. Parte desse resultado será absorvido pelas chamadas produções “on farm”, que precisarão de um ambiente regulatório específico no futuro.

A análise de eficiência, eficácia e efetividade de programas deve ser parte integrante do ciclo de formulação e implementação das políticas públicas. Modelos econométricos, análise de impacto e dados sistematizados são ferramentas essenciais para evitar desperdício de recursos e garantir que as políticas estejam, de fato, beneficiando os produtores rurais e a sociedade como um todo.

Recentemente, o Tribunal de Contas da União (TCU) emitiu uma recomendação ao Ministério do Planejamento para que seja feita uma análise mais detalhada do Plano Plurianual (PPA) com o objetivo de evitar sobreposição de programas rurais. Essa medida evidencia a necessidade de aprimorar os mecanismos de avaliação e monitoramento das políticas públicas no setor agropecuário.

A sobreposição de programas pode gerar desperdício de recursos e conflitos na execução de iniciativas que deveriam ser complementares. A recomendação do TCU sinaliza que há espaço para maior integração e planejamento estratégico, garantindo que as políticas realmente atendam às necessidades do setor produtivo sem dispersar investimentos em iniciativas concorrentes ou ineficientes.

O caso do PLANAPO, e de sua derivação para um programa de bioinsumos, além da recente recomendação do TCU, reforçam a urgência de aprimorar a análise das políticas públicas rurais. O Brasil precisa adotar uma cultura de avaliação contínua, baseada em evidências concretas, para garantir que os programas implementados alcancem os resultados esperados e beneficiem efetivamente os agricultores e a economia agropecuária.

A insistência em desenvolver um programa de redução do uso de agrotóxicos (PNARA), tendo como origem o mesmo PLANAPO, parece ser a mesma cortina de fumaça que nunca teve métrica, meta e nem tem futuro. Identificar os reais problemas da produção agropecuária e enfrentá-los com estratégia e eficiência, parece ser a conclusão óbvia dos auditores do TCU.

Sem uma estrutura de monitoramento eficiente, corremos o risco de perpetuar políticas ineficazes e desperdiçar recursos que poderiam ser mais bem alocados. A avaliação qualificada deve ser a espinha dorsal das decisões governamentais, assegurando um setor agropecuário mais competitivo, inovador e sustentável. Não existe mais espaço para discurso sem conteúdo, programas sem indicadores e gestores sem compromisso.

Luís Eduardo Pacifici Rangel é membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS), Engenheiro Agrônomo, Ex-Secretário de Defesa Agropecuária e Ex-Diretor de Análise Econômica e Políticas Públicas do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA).

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