A forte recuperação do rendimento mensal do brasileiro desde a pandemia consegue destacar-se entre os ótimos índices da carne bovina em produção, vendas internas e exportações
É um caleidoscópio altamente positivo. Com bons números saltando de todos os lados. O que até confunde a compreensão clara sobre o real e atual estágio do ciclo pecuário brasileiro. O certo é que as exportações vão quebrar novo recorde em 2024, com mais de três milhões de toneladas. E o número será ainda maior em 2025. A produção segue aumentando como nunca. Cravando mais de 11 milhões de toneladas. O preço do bezerro reagiu e o do boi gordo mais ainda, com a arroba tendo chegado a R$ 324, movimento que chegou a 51% de elevação na região de Cuiabá (MT), a que mais valorizou. E o consumidor brasileiro no supermercado e açougue vem comandando as compras da oferta interna do setor mês após mês.
“Estamos com uma capacidade de consumo como não víamos há muito tempo. Que vem se refletindo no aumento das compras de carne bovina. Alimentado pelo aumento da renda dos brasileiros, do PIB (Produto Interno Bruto) per capita e da queda da taxa de desemprego. Um panorama semelhante a 2012. Mesmo com os cortes bovinos aumentando de preço. Duelando com o avanço da carne suína e a estabilidade da carne de frango. Até o ovo acabou ficando para trás. Olhamos demais para o boi e os preços, e bem menos para o consumidor. O preço da carne subiu em dólar e pela primeira vez o preço do boi é direcionado pela demanda. Interna e externa”, analisou Lygia Pimentel, pecuarista, analista e sócia fundadora da Agrifatto, que abriu a reunião de novembro passado da Associação Brasileira das Indústrias de Suplementos Minerais, a ASBRAM, em São Paulo.
Lygia fez questão de ressaltar como o bom resultado do nosso varejo da carne pode embaralhar um pouco a visão mais clara sobre o exato instante e as condições da virada do ciclo pecuário. “O ciclo é uma retroalimentação produtiva estimulada pelos preços. Se bezerro e boi gordo sobem, há retenção de fêmeas. Aí, vem aumento da produção de bezerros, o preço começa a cair e cresce o abate de fêmeas. Se o preço caiu e não há oferta de fêmeas, os preços do boi caem, assim como a produção de bezerros, que depois volta a subir. O único fator que é preponderante é a duração do ciclo. Por isso, os pecuaristas devem sempre olhar para a frente e não para trás. Os ciclos vão permanecer. E permear tendências de longo prazo. Quem fica na cadeia produtiva vai ter que produzir mais na mesma área. Quem não consegue lidar com o ciclo e aumentar a produtividade vai ser eliminado nas fases de baixa. Essa é a questão”, decretou.
E entender a nova realidade do ciclo pecuário é realmente necessário para a fazenda brasileira. Como referendou Felipe Fabbri, zootecnista da Scot consultoria e segundo convidado da reunião da Associação. “O momento é realmente especial. Demanda aquecida, recorde nos abates, melhor preço no mercado internacional. Estamos atrativos no Brasil e no exterior, boi valorizado. O confinamento ganhou força em 2024 pelo preço do boi magro e o custo mais baixo dos insumos. E nos perguntamos: entramos em fase de alta ou não? Penso que ainda é cedo. São vários sinais, mas não podemos cravar que é a virada efetiva da fase”, reconheceu.
E que sinais! Felipe acrescentou que os chineses, principais compradores da nossa proteína vermelha, estão gostando de comer a carne bovina e não mais apenas substituindo por problemas ocasionais no fornecimento interno e externo de frango e suínos. “As vendas externas se elevam também por participação de mercado e novos compradores. E no front interno, houve ganho real de competitividade no atacado diante das carnes de frango e suína, e o mercado interno respondeu”, concordou.
Os dois especialistas concordaram que 2025 será recompensador para o segmento. Como nunca. Mesmo sem sabermos exatamente como está se dando a aguardada virada do ciclo. “O boi gordo pode chegar a mais de R$ 400 na virada 2025 – 2026. Mesmo com abates ainda acelerando, incluindo oferta de fêmeas no início de 2025. Não vamos esquecer que o boi subiu em 2024 motivado mais por queimadas, falta de pastagens e dificuldade de entregar bezerros mais pesados. E os três primeiros meses de 2025 podem ser o melhor período da história. Um alinhamento de ciclos das cadeias produtivas de grandes produtores de carne bovina. Porém, é preciso cuidado porque a área de pasto está diminuindo, com transferência de áreas para regeneração florestal, preservação ou outras opções. E há grandes nomes da Agricultura entrando no negócio. O que é bom porque a pecuária precisa de tecnologia para produzir mais do que a média nacional de cinco arrobas por hectare. É uma atividade mais arriscada. Precisa de eficiência”, adicionou Lygia.
“Efetivamente, o preço subiu no fim do ano, mas não deve prejudicar as vendas por causa das festas de fim de ano. No início de 2025, não devemos esquecer dos gastos extras da família brasileira, com IPVA e IPTU, a disparada da inflação e da taxa de juros, e a oferta de bovinos. Ainda bem que a exportação deve permanecer muito boa”, acrescentou Felipe Fabbri.
O alerta para a euforia apontou, também, os graves problemas fiscais do governo federal, o aumento dos gastos públicos em todas as esferas, alta de juros e a disparada do dólar. “Tem mais. Pressão ambiental, social, econômica, de marketing, necessidade de alimentos. Sem falar que a demanda sempre merece cuidado. Mas, apesar de que a pecuária é mesmo risco elevado, o curto prazo mostra um mercado com excelentes oportunidades de venda”, finalizou Lygia Pimentel.
O encontro terminou com novos números do mercado de suplementos minerais e a previsão econômica para o Brasil e o mundo, com o Doutor em Economia, Professor da Fundação Getúlio Vargas (FGVAgro) e responsável pelo Painel de Estatística de Comercialização de Suplementos Minerais da entidade, Felippe Cauê Serigati. “Só em outubro, o crescimento nas vendas de suplementos minerais foi de 23% sobre outubro de 2023. O que alimenta ainda mais um cenário total de transação 8% acima do ano passado. E concordo que o novo ano pecuário vai ser excelente. Os países emergentes vão crescer menos, mas o mundo vai acelerar em média de 3 a 3,5% em 2025. E o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê aumento nos preços dos alimentos. Está certo que há dúvidas envolvendo o presidente americano, guerra comercial contra a China, mas as perspectivas não deixam de ser boas”, examinou. “O que resta para nós, indústrias da suplementação mineral, é continuar crescendo acima de dois dígitos”, brincou ao final o presidente da ASBRAM, Fernando Penteado Neto.