O Brasil, com sua vasta extensão territorial e recursos naturais abundantes, tem sido historicamente reconhecido como um dos principais exportadores de produtos agrícolas do mundo. No entanto, a dinâmica do mercado global e as mudanças nas relações comerciais têm apresentado desafios significativos para o setor agropecuário, ao mesmo tempo em que se abrem novas oportunidades de crescimento e expansão.
Agora mais recente, temos acompanhado pela mídia os protestos de agricultores em vários países na Europa, especialmente na França. Uma situação que tem levantado preocupações sobre possíveis impactos nas relações comerciais internacionais e no comércio entre o Brasil e a União Europeia (UE). Os manifestantes expressam insatisfação com os crescentes custos de produção, sobretudo relacionados ao aumento do preço do diesel e às exigências ambientais mais rigorosas, como parte do Pacto Verde europeu. Essas demandas levantam questões sobre a competitividade dos produtos agrícolas europeus em comparação com os importados de outras regiões, incluindo o Brasil.
Para entender melhor os possíveis desdobramentos, é importante analisar o contexto das relações comerciais entre o Brasil e o bloco europeu. O acordo comercial entre o Mercosul e a UE, negociado ao longo de duas décadas e finalizado em 2019, representa uma oportunidade significativa para o agronegócio nacional expandir seu acesso ao mercado de lá. No entanto, a ratificação e implementação plena desse acordo têm enfrentado obstáculos políticos e resistência de certos setores da sociedade civil europeia, especialmente em relação às preocupações ambientais e sociais.
Esses protestos de agricultores na Europa podem intensificar essa resistência e aumentar as barreiras não tarifárias impostas à entrada de produtos agrícolas de fora do bloco. Isso poderia impactar negativamente as perspectivas de exportação do agro brasileiro e dificultar ainda mais a conclusão e implementação do acordo Mercosul-União Europeia.
No entanto, apesar dos desafios apresentados na Europa, o setor agropecuário brasileiro continua a registrar números impressionantes de exportação. Em 2023, segundo a Secretaria de Comércio e Relações Internacionais do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa) atingiu o recorde de US$ 166,55 bilhões, representando um aumento significativo em relação ao ano anterior. Esse desempenho é impulsionado principalmente pela forte demanda global por commodities agrícolas, como soja, milho, carne bovina, entre outros.
O Centro-Oeste brasileiro, especialmente os estados de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Goiás, desempenha um papel crucial nesse cenário, sendo responsável por uma parcela significativa das exportações. Dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea) revelam que a região exportou 680,1 mil toneladas de carne bovina in natura entre janeiro e setembro de 2022, representando 45,3% do total exportado pelo Brasil nesse período.
Esses números destacam a importância estratégica da região para o agronegócio nacional e sua contribuição para a balança comercial do país. No entanto, é importante reconhecer que o setor enfrenta uma série de desafios, incluindo questões ambientais, sociais e regulatórias, que podem afetar sua competitividade no mercado global. Por exemplo, a União Europeia implementou recentemente regulamentações mais rigorosas, como a Deforestation-free Regulation, que exige a ausência de desmatamento e violações de direitos humanos em toda a cadeia de produção de produtos agrícolas importados. Essas regulamentações, embora tenham como objetivo promover a sustentabilidade, também podem impor ônus adicionais aos produtores brasileiros e dificultar o acesso aos mercados europeus.
Dentre os desafios apresentados por essas regulamentações e políticas, destaca-se o imposto do carbono (Carbon Border Adjustment Mechanism – CBAM) proposto pela UE, o qual visa quantificar e precificar as emissões de carbono incorporadas em produtos importados. Essa medida pode aumentar os custos de produção e exportação para o Brasil, representando um desafio adicional que exige uma resposta estratégica por parte do governo e dos produtores.
No entanto, apesar das dificuldades impostas por tais medidas, o Brasil possui vantagens comparativas significativas no mercado global de alimentos. Com sua vasta extensão de terras férteis, clima favorável e tecnologia agrícola avançada, o país está bem posicionado para atender à crescente demanda por alimentos, especialmente em um contexto de crescimento populacional e mudanças nos padrões de consumo.
Além disso, nossa nação tem se empenhado em promover a sustentabilidade e a responsabilidade ambiental em sua agricultura. Programas como o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) visam fomentar práticas agrícolas mais sustentáveis, incluindo a integração lavoura-pecuária-floresta, o plantio direto, a recuperação de áreas degradadas e a regularização ambiental de propriedades rurais. Essas iniciativas demonstram o compromisso do Brasil com a conservação ambiental e o desenvolvimento sustentável de sua agricultura.
Essas iniciativas não apenas contribuem para a redução das emissões de gases de efeito estufa e o combate ao desmatamento, mas também fortalecem a imagem do Brasil como um fornecedor confiável e sustentável. Isso vale ouro em um mercado global cada vez mais consciente e preocupado com as questões ambientais, essas credenciais podem se tornar um diferencial competitivo.
O Brasil tem buscado diversificar seus mercados de exportação e reduzir sua dependência de determinados parceiros comerciais. A crescente demanda por alimentos em mercados emergentes, como China, Índia e países do sudeste asiático, oferece novas oportunidades de expansão para o agronegócio. O aumento do consumo de proteínas animais e a demanda por commodities agrícolas, como soja e milho, nessas regiões podem impulsionar ainda mais as exportações brasileiras nos próximos anos.
Para aproveitar plenamente essas oportunidades, é preciso enfrentar uma série de desafios internos, incluindo infraestrutura precária, burocracia excessiva, questões fundiárias e insegurança jurídica. Investimentos em logística, transporte, armazenamento e tecnologia são essenciais para aumentar a eficiência e a competitividade do agronegócio brasileiro no mercado global.
É imprescindível que o país intensifique seus esforços na diplomacia agrícola e busque uma maior integração com organizações internacionais e blocos comerciais regionais. A diversificação de mercados e a busca por parcerias estratégicas podem contribuir significativamente para reduzir a vulnerabilidade do agronegócio brasileiro a flutuações no comércio internacional e a eventuais crises econômicas globais.
Em resumo, o agronegócio brasileiro enfrenta desafios significativos em um contexto global marcado por mudanças e incertezas. Os protestos de agricultores na Europa, as regulamentações ambientais mais rigorosas e as políticas protecionistas representam obstáculos importantes para as exportações brasileiras. No entanto, o país também possui vantagens comparativas significativas e oportunidades de crescimento, especialmente em mercados emergentes.
Para capitalizar essas oportunidades e enfrentar os desafios, é essencial que o Brasil adote uma abordagem estratégica e coordenada, envolvendo o governo, o setor privado, a sociedade civil e outros stakeholders relevantes. Investimentos em infraestrutura, inovação tecnológica, sustentabilidade e diplomacia agrícola são fundamentais para garantir o desenvolvimento econômico e sustentável do agronegócio brasileiro no século XXI.
ALeandro Viegas é administrador de empresas, bacharel em Direito e CEO da Sell Agro.