A agricultura brasileira é uma das mais competitivas e diversificadas do mundo, produzindo alimentos, fibras, energia e biocombustíveis para o mercado interno e externo. Para alcançar esse desempenho, os produtores rurais utilizam diferentes tecnologias, entre elas os defensivos agrícolas, que são substâncias químicas ou biológicas usadas para controlar pragas, doenças e plantas daninhas que afetam as culturas e, também, que estimulam o crescimento das plantas. O uso dos agrotóxicos contribui para o aumento da produtividade e da qualidade dos produtos agrícolas, reduzindo as perdas causadas pelos agentes fitossanitários. Segundo dados da Conab[1], a produção brasileira de grãos na safra 2021/22 foi estimada em 271,2 milhões de toneladas, portanto quase 14,5 milhões de toneladas a mais do que o ciclo anterior. Além disso, o Brasil é o quarto maior produtor de grãos (arroz, cevada, soja, milho e trigo) do mundo, sendo responsável por 7,8% da produção mundial. O Brasil também lidera a produção e a exportação de soja, café e açúcar.
E qual é o papel do receituário agronômico nesse contexto?
O receituário agronômico é um documento emitido por um profissional legalmente habilitado, que contém as informações sobre a cultura a ser tratada, o diagnóstico fitossanitário, a recomendação dos produtos a serem utilizados, as doses, os intervalos de aplicação e de entrada na lavoura, os equipamentos adequados, as medidas de segurança e os cuidados com o meio ambiente. Esse documento se tornou obrigatório para a venda dos defensivos agrícolas no Brasil desde 1989, quando foi sancionada a Lei Federal nº 7.802, que regulamenta o uso desses produtos no país. Antes disso, apenas no Estado do Rio Grande do Sul se ensaiavam medidas para implementação dessa recomendação.
É certo que o objetivo da lei foi garantir que os defensivos agrícolas fossem utilizados de forma racional e segura, seguindo as recomendações técnicas e as normas legais vigentes. Por isso, a legislação brasileira exige que a venda desses produtos somente seja feita mediante a apresentação de um receituário agronômico. Contudo, o receituário agronômico não é apenas uma exigência legal, mas também uma ferramenta para o uso racional e sustentável dessa tecnologia. Ele orienta o produtor sobre a escolha do produto mais adequado para cada situação, aumentando a produtividade e evitando o desenvolvimento de resistência dos organismos-alvo. Além disso, ele contribui para a rastreabilidade dos defensivos agrícolas utilizados na cadeia produtiva, facilitando o monitoramento e a fiscalização pelos órgãos competentes.
Diante desse cenário, é fundamental valorizar a importância do receituário agronômico e do profissional habilitado responsável pela sua prescrição. O receituário não deve ser apenas um instrumento exigido para a venda de produtos fitossanitários de controle, mas sim um instrumento efetivo de recomendação técnica. Nesse sentido, foi louvável a iniciativa do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), em publicar em 2018, a Instrução Normativa SDA nº 40, que estabelece regras complementares a emissão da receita agronômica, principalmente no que se refere à associação de produtos com a indicação de possíveis incompatibilidades. Afora isso, reforçou a competência e a responsabilidade do Engenheiro Agrônomo na interpretação das recomendações oficiais, visando a elaboração da receita agronômica em consonância com as boas práticas agrícolas e com as informações científicas disponíveis.
Além disso, é importante ressaltar que os órgãos de fiscalização de alguns Estados, como São Paulo (Resolução SAA 47/2023) e Goiás (Instrução Normativa nº 03/2019), com o objetivo de reforçar a importância do receituário na aplicação dos produtos, passaram a exigir, em algumas situações, a emissão da “receita de uso”, que permite uma avaliação mais precisa no momento da aplicação do produto. O receituário agronômico é um instrumento fundamental para o aumento da produtividade e da sustentabilidade na agricultura brasileira e para que ele cumpra esse papel é preciso que toda a cadeia o valorize. Somente assim será possível garantir a manutenção da nossa produção de alimentos saudáveis e seguros e a competitividade da agricultura brasileira.
Lidia Cristina J. dos Santos é advogada e membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS).