Nesse mesmo período o Brasil descobriu a fórmula para vencer as dificuldades da produção agrícola em regiões tropicais dominadas por solos pobres e pragas abundantes. A solução veio da combinação de tecnologias inovadoras e agricultores capacitados que migraram para os cerrados do Centro-Norte do País, ganhando produtividade e combinando economias de escala (grandes propriedades) e de escopo (duas safras por ano, integração lavoura-pecuária). O Brasil especializou-se em atividades intensivas em terra e capital, a exemplo do complexo integrado de produção de grãos e carnes e da produção eficiente de açúcar, etanol e bioeletricidade de cana-de-açúcar.
As profundas transformações do Brasil e da China se casaram em 2000, quando a demanda explosiva por proteína animal (carnes, pescados e lácteos) da classe média emergente chinesa se encontrou com a imensa oferta de soja do cerrado brasileiro. A soja, uma planta originária da China, é a principal fonte de proteína da alimentação animal. De 2000 a 2020 as importações chinesas saltaram de 2% para 35% da pauta exportadora do agronegócio brasileiro, tornando a China, de longe, a principal cliente global do Brasil. O agronegócio responde por metade das exportações totais do Brasil para a China. No sentido inverso, o Brasil tornou-se o principal fornecedor de produtos agropecuários para a China, respondendo por 20% das importações do país asiático e ocupando o primeiro lugar nas importações chinesas de soja, celulose, açúcar, algodão e carnes bovina e avícola.
O comércio do agronegócio decolou entre os dois países, mas muito ainda pode ser feito para ampliá-lo nos dois sentidos, aumentando volumes e diversificando e diferenciando os produtos comercializados. Mas o comércio não é tudo. Há imensas oportunidades para maior cooperação entre os dois países em áreas como investimentos, infraestrutura, sustentabilidade, ciência e inovação. A China poderia beneficiar-se dos conhecimentos sobre tecnologia tropical brasileira na agropecuária e em bioenergia, principalmente em etanol combustível. O Brasil poderia conectar-se à revolução digital, de drones e do comércio eletrônico da China. O Brasil carece de capital e investimentos na agricultura e de melhorias na infraestrutura de apoio ao setor. Os dois países enfrentam grandes desafios no tema da sustentabilidade: o Brasil, nas questões ligadas a desmatamento ilegal, biodiversidade e uso da terra; a China, em temas como falta de água, degradação de solos, poluição do ar e mau uso de pesticidas.
São 12 capítulos em inglês que trazem análises e perspectivas chinesas e brasileiras de 24 especialistas ligados às duas universidades. O livro analisa a evolução da agricultura e das políticas agrícolas nos dois países, os casos de maior sucesso internacional e uma ampla discussão sobre temas-chave da relação bilateral, como comércio, infraestrutura, investimentos, inovação e sustentabilidade. O lançamento será feito por meio de um debate virtual organizado pela Esalq no dia 3 de junho às 10 horas, em seguida será posta à disposição a versão eletrônica do livro para download gratuito. Trata-se provavelmente da mais completa obra já produzida sobre as relações Brasil-China no agronegócio.
O texto sintetiza o livro China-Brazil Partnership on Agriculture and Food Security, que será lançado no dia 3 de junho pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiróz (Esalq-USP) e pela China Agricultural University (CAU), por meio de um debate virtual e da disponibilização da versão completa da obra para download gratuito.
Marcos Sawaya Jank é professor de agronegócio global do Insper e titular da Cátedra Luiz de Queiroz da Esalq-USP.
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