Entender o sistema solo como um ambiente extremamente complexo, dinâmico e vivo, é algo que faz a diferença no manejo agrícola. O solo é basicamente composto por três pilares, o químico, o físico e o biológico. Os dois primeiros são mais trabalhados e conhecidos pelo meio produtivo, muito devido ao desenvolvimento de estudos e pesquisas voltados a estes conhecimentos e objetivando entender e melhorá-los cada vez mais. O componente biológico do sistema solo, no entanto, ainda necessita ser inserido neste contexto de forma sistêmica, o que possibilitará entender e associar seu aspecto funcional inclusive com relação a química e física do solo. Pois neste momento já se entende que não é viável ou sensato a análise de atributos do solo de forma isolada.
Informações sobre o potencial da biologia do solo e seus benefícios ainda precisam ser mais explorados e relacionados aos resultados observados a campo, exceto em relação a funções específicas como fixação biológica de nitrogênio (FBN), por exemplo. A funcionalidade do sistema está ligada à biodiversidade dos grupos de organismos ou microrganismos que compõem a biologia do solo. Quando nos referimos aos microrganismos, este potencial funcional é ainda maior, visto que estudos revelam que realmente temos ‘um mundo debaixo dos nossos pés’, com mais de dez mil espécies de microrganismos por grama de solo.
Neste sentido, surge o termo microbioma do solo, que nos remete ao entendimento deste aspecto funcional como algo dependente da ação conjunta dos integrantes deste sistema microbiológico do solo. A busca pelo entendimento acerca da complexidade e dinâmica destas funções no sistema de produção tem sido foco de muitos produtores agrícolas, e com certeza trata-se de uma mudança de paradigma na forma de produzir, com sustentabilidade e rentabilidade.
Um facilitador deste processo são as tecnologias que estão sendo inseridas no mercado com esta visão de reativar a biodiversidade deste microbioma do solo. Tecnologias que, além de trazer a possibilidade de revitalização biológica dos solos, ainda têm um importante papel como disseminadores do conceito da biologia do solo aliado à qualidade e funcionalidade do sistema de produção.
Funções relacionadas à disponibilização de nutrientes pela ação mineralizadora de fontes orgânicas advinda da atividade enzimática destes microrganismos, pela melhoria no perfil do solo propiciando o melhor desenvolvimento do sistema radicular, atuando na agregação e porosidade dos solos, além da produção de substâncias importantes para o desenvolvimento vegetal, como hormônios vegetais. A proteção de plantas também é uma função extremamente importante no campo de produção, e esta basicamente é uma resposta ao equilíbrio biológico promovido pela biodiversidade do solo. O solo, biologicamente ativado e equilibrado, é resiliente e menos dependente de ações antrópicas ao longo do cultivo da cultura.
A necessidade de trazer os componentes biológicos para atuarem nos sistemas de produção ocorre em resposta a atual forma de manejo. Por exemplo, devido à substituição ou talvez a não inserção do sistema de plantio direto, que tem como um de seus princípios a rotação de culturas. Com o modelo de sucessão de culturas, muitas vezes inserido por causa da demanda financeira, não ocorre a alteração durante ciclos produtivos das culturas implantadas na área, ou seja, são implantadas as mesmas culturas em cada período de cultivo (verão/inverno) e utilizadas as mesmas fontes de adubos, produtos fitossanitários, entre outros. Com essa homogeneização do sistema de produção, chamado de monocultivo, ocorre uma diminuição da biodiversidade dos organismos do solo e assim, do seu potencial funcional em todo sistema solo – planta. Quando nos referimos a ambientes que são cultivados com culturas perenes ou semi perenes, a situação é ainda mais preocupante, em virtude da manutenção da mesma cultura por um período ainda maior.
Muitos produtores já entenderam a necessidade de alterar este sistema de produção, inserindo as chamadas plantas de cobertura na entressafra e/ou tecnologias ligadas a bioativação do microbioma do solo nas culturas de interesse econômico. Os resultados realmente são surpreendentes e revelam que em pouco tempo esta forma de produzir pode revolucionar a agricultura. Parte desta conquista também se deve ao sucesso das tecnologias com microrganismos específicos, que são direcionadas a um determinado alvo no sistema de produção, por exemplo, os nematoides e insetos. Outro ponto interessante são as formas de avaliação desta parte biológica do solo, que estão em constante melhoria, e neste sentido, percebe-se um empenho de diversos setores voltados aos estudos, pesquisas e análises para tentar facilitar os conceitos e os resultados obtidos.
Em síntese, o restabelecimento da biologia do solo representa um importante degrau neste novo momento da agricultura mundial. A mudança de ambientes anteriormente degradados biologicamente para ambientes com elevada biodiversidade e funcionalidade no sistema solo – planta é fundamental para obtermos a qualidade do solo, e por consequência, do sistema de produção.
Dorotéia Alves Ferreira é Engenheira Agrônoma, Doutora em Solos e Nutrição de Plantas e Gerente de Produto da Fertiláqua
Fonte: Assessoria de Imprensa