O agronegócio brasileiro é a potência que é porque lá atrás desenhou um futuro e preparou-se para buscá-lo e depois continuar construindo sua expansão. Um dos fatos que mostram isso é a produtividade do trabalho no agro, que evoluiu na casa de 5% ao ano, de 1985 a 2015. Só para comparar, no mesmo período a indústria teve um desempenho negativo (-1% ao ano) e o setor de serviços ficou estagnado, rondando zero.
Um estudo da Secretaria de Agricultura de São Paulo, no fim dos anos 1990, apontava que no Estado 80% dos trabalhadores rurais que lidavam com defensivos agrícolas tinham no máximo quatro anos de escolaridade. Essa história é contada no Centro de Engenharia e Automação (CEA) do Instituto Agronômico (IAC), lembrando que também recebiam pouco treinamento e a informação técnica gerada pela pesquisa enfrentava gargalos para chegar ao campo.
As dificuldades foram, então, progressivamente encaradas de modo mais intensivo e coordenado por programas de governo (como é o caso do próprio CEA), ou via parcerias com indústrias do setor, levando treinamento especializado para aplicadores e produtores rurais. Uma dessas parcerias público-privadas, por exemplo, já tem 12 anos de atuação e treinou 65 mil agricultores de todo o Brasil, em mais de 3.000 ações de campo.
Também por volta do ano 2000, pouco se conhecia ainda sobre a segurança de EPIs para trabalhar em tratamentos fitossanitários. Na época, segundo o CEA, nem normas de qualidade existiam para a produção desse tipo de equipamento e foi então que os primeiros estudos começaram a estabelecer protocolos técnicos e de qualidade para EPI agrícola, cuja consolidação iria acontecer cerca de cinco anos depois.
Quando se pensa no Brasil como um todo, ainda há desalinhamentos entre o ideal e a realidade nessa questão de qualidade e produtividade do trabalho. O importante é estimular propostas concretas de ação, como a ideia de “pesquisa participativa” experimentada agora pelo IAC no programa Aplique Bem, engajando o agricultor como multiplicador regional, para ganhar tempo e terreno no desafio de auditar pulverizadores e qualificar aplicadores.
Como naquele final de século XX, nosso agronegócio vive hoje um ponto de inflexão, com a chegada das tecnologias de informação, automação e inteligência artificial. Uma poderosa onda de inovações está em curso e começa a revolucionar os padrões de produção e gestão operacional no campo. Tecnologias disruptivas já estão em uso, outras evoluem rapidamente, e seus impactos serão profundos sobre o perfil dos empregos e dos profissionais.
O agro precisa fazer com urgência reflexões sobre as necessidades, e os requisitos de qualificação e treinamento, de recursos humanos para o agro digitalizado. Isso vale para todas as cadeias produtivas, pois nada avança sem capital humano. Ou melhor, nada melhora de forma sustentável sem recursos humanos com a qualificação necessária para as profundas transformações do mundo de hoje, não só no agro, aliás, mas em toda a economia.
Coriolano Xavier é membro do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e Professor da ESPM.
Fonte: Assessoria de Imprensa