A nova Lei dos Bioinsumos é uma nova realidade para a agricultura brasileira

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O Presidente do Conselho Deliberativo da Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal (Abisolo) comemora a nova Lei dos Bioinsumos e fala de uma nova realidade para a agricultura tropical brasileira.

O técnico agrícola, empresário e líder classista Roberto Levrero é um homem sereno. Tem a paz estampada no rosto, como um monge. Voz calma, baixa, sorriso contido e ‘pé no agro’ há quase sessenta anos. Desde pequeno, pegou no pesado ao lado do pai, um descendente de italianos que se instalou na pacata e montanhosa Valinhos, a menos de 100 quilômetros da capital paulista, dirigindo açougues. Durante quatro décadas, Ítalo Antônio Levrero vendeu carnes para os consumidores, sebo para a indústria e farinha de osso para os produtores de frutas da região e agricultores de pimenta do Pará. Mas nosso personagem conseguiu tempo para estudar no Instituto Agronômico de Campinas e ajudar o pai a erguer uma indústria de fertilizantes.

“Era um curso que dava para fazer porque tínhamos que trabalhar em algum período do dia. Ao mesmo tempo, o adubo surgiu assim. A gente via o pessoal comprando orgânicos, farinha, mineral e fazendo as misturas. Resolvemos estudar e decidimos entrar no negócio. Por que não entregarmos tudo pronto? Assim começou a nossa indústria”, relembra Roberto. Em 1967, a família fundou a fábrica de adubos São Sebastião, que cresceu nos anos 1970. Na década seguinte, recebeu o reforço de Ítale Sérgio Levrero, mudando o nome da empresa para ‘Ítalo A. Levrero & Cia Ltda’. A corporação enfrentou uma inflação galopante, crescimento estagnado e crise da dívida externa, mas insistiu em novos programas e desenvolveu o seu próprio Fertilizante Organomineral com alta concentração, passando a ser pioneira neste produto. Foi quando Roberto entrou na sociedade. Nos anos 1990, sem o sócio fundador, a empresa passa a se denominar Ítale Indústria e Comércio Ltda. E avança no mercado mesmo com adversidades, conseguindo crescer no mercado nacional, produzir mais e ampliar as instalações para 55 mil m² e indústria com 10.000m². “Temos toda a linha de organominerais, são mais de trezentas formulações para pequenas, médias e grandes lavouras. Uma empresa ecologicamente correta. O segmento vem crescendo, mostrando sua evolução, conquistando espaços”, conta.

Na virada do século, Roberto mergulhou em outra atividade intensa. O dia a dia da Associação Brasileira das Indústrias de Tecnologia em Nutrição Vegetal, a poderosa e influente Abisolo, que nasceu em 2003 para representar e defender os interesses das empresas fabricantes e importadores de fertilizantes minerais, organominerais, orgânicos, biofertilizantes, condicionadores de solo de base orgânica, substratos para plantas, insumos de base biológica e adjuvantes. A associação reúne hoje mais de 150 empresas, que empregam 25 mil pessoas, cresce uma média de 28% ao ano, faturam mais de R$ 22 bilhões (2022), tem sede em Campinas (SP), usa a Distribuição para ter capilaridade em todo o território brasileiro e participa ativamente das discussões de temas de interesse do setor junto aos diversos Ministérios e Secretarias, Órgãos de Controle e Fiscalização Ambiental, Instituições de Pesquisa, Receitas Estadual e Federal, além de outras entidades representativas de diferentes setores da sociedade civil. Um caminho dividido quase plenamente. “São dezoito anos de Abisolo e quatorze na Presidência”, brinca Levrero.

Porém, os dois últimos anos não foram ‘diversão’. Centenas e centenas de horas de levantamentos, debates, acordos, negociações, principalmente em Brasília. Tudo para ver aprovado o Projeto de Lei 658/2021, o chamado ‘PL dos Bioinsumos’, no fim do ano passado, publicado no Diário Oficial no dia 24 de dezembro, como a Lei 15.070, de 23 de dezembro de 2023.

O texto aprovado prevê normas para produção de bioinsumos nas fazendas e indústrias. O próximo passo será a regulamentação da lei, que deve ocorrer ao longo de 2025. É necessário que ela esteja alinhada aos protocolos internacionais de segurança reconhecidos por instituições como a Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). As normas precisarão de diferentes nivelamentos para garantir segurança e eficácia tanto para produtos altamente tecnológicos, baseados em técnicas genéticas e moleculares, quanto para insumos de base natural mais tradicionais, como insetos e biofertilizantes. A regulamentação deve ser uma ferramenta para impulsionar o desenvolvimento do mercado de inovação e atrair novos investimentos. “Foi um acordo amplo, que reuniu o apoio de 52 entidades, junto ao Instituto Pensar Agropecuária (IPA), em dois anos de tramitação. Uma nova legislação, moderna, muito representativa, que garante a indústria, os distribuidores e os produtores rurais. Não esperava surpresas sobre a sanção”, suspirou Roberto Levrero durante um encontro dele e da equipe com os profissionais do Grupo Publique, na sede da Abisolo, no fechamento de 2024. Ele também falou sobre o apoio que a entidade deu à cobertura que as Plataformas Programa Carlão, AgroRevenda e Publique AgroAgência realizou na COP 29, no Azerbaijão. Acompanhe.

AgroRevenda – O ambiente de negócios dos bioinsumos nos últimos anos tem sido bem competitivo. Como você enxerga o setor como empresário?
Clorialdo Roberto Levrero – Quando você é uma andorinha só, para ‘fazer verão’ é mais difícil. Quando seu negócio tem companhia, chama mais a atenção, sua atuação fica mais bonita, é mais fácil os profissionais da área enxergarem a importância. O setor vem evoluindo bastante, mostrando sua importância, ambientalmente falando é um produto mais sustentável e tem ótimo custo/benefício, deixando a planta mais forte para enfrentar as adversidades no campo. Entrega produtividade, lucro e qualidade, padronização, tempo de colheita melhor, mais nutrientes, resistentes. Sem falar que funciona bem diante das inúmeras características de clima e solo que o Brasil tem. Melhor do que as tecnologias convencionais. É uma tendência que não tem volta.

AgroRevenda – E o papel da Abisolo neste mercado?
Clorialdo Roberto Levrero – Temos conseguido demonstrar as qualidades dessas tecnologias. Com o trabalho de 150 empresas. Em muitos setores, com representação de até 100%. São indústrias grandes, pequenas, multinacionais, representando basicamente oito segmentos. Com todos os ciclos e os processos de produção. Adjuvante, substrato, todas as formas de aplicação, foliar, sementes, um pacote completo, a única entidade que une todos os segmentos. E, a partir da alteração do estatuto que fizemos, ao colocar os biológicos em nosso campo, que pega desde a nutrição até a defesa, com adjuvantes, remineralizadores, bioestimulantes, biofertilizantes, organominerais, condicionadores de solo e minerais especiais.

AgroRevenda – Seu atual mandato vai até o fim deste ano. Qual a principal tarefa agora, depois da Lei dos bioinsumos?
Clorialdo Roberto Levrero – Temos todo o trabalho da regulamentação da lei, que definiu apenas as diretrizes. Temos o processo da reforma tributária, o autocontrole com todo o detalhamento da regulamentação. Serviço garantido para o ano inteiro e com muita emoção (RS!). Sem falar que podem surgir novidades. O projeto aprovado ficou totalmente adequado, enquadrado. Tentamos promover desde o início, tínhamos dois textos distorcidos. Misturavam muito, não conseguiram aprovação. O texto substitutivo partiu da Abisolo. Procuramos as outras entidades, a produção industrial, das fazendas, está todo mundo no mesmo barco. Precisamos criar uma regra que dê segurança para todo mundo. Para quem vai produzir e quem vai consumir. E os órgãos reguladores tem que receber condições ideais para fazer a fiscalização. Foi o que buscamos em milhões de reuniões, buscando o consenso, o meio termo. Foi o que tentamos trazer. Harmonizar. E todas as entidades assinaram junto ao Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), o que deu robustez. Um documento equilibrado que vai ajudar a começarmos a trabalhar. Estruturar todo o setor, do início ao fim, com regras claras.

AgroRevenda – A partir de agora, qual é o papel das tecnologias dos produtos químicos?
Clorialdo Roberto Levrero – Vai continuar sendo importante. Nem tudo vai ser possível ser substituído. Temos que pensar nas soluções biológicas como complementares, o que depende da variedade das condições da agricultura brasileira. A palavra chave não é substituição e sim sinergia. Andando juntas. Prova disso é que as grandes corporações estão começando a pesquisar e utilizar as novas tecnologias, mirando sempre a eficiência.

AgroRevenda – E o futuro dos biológicos?
Clorialdo Roberto Levrero – A Abisolo despertou a capacidade da nossa indústria. Não tínhamos uma regulamentação que propiciasse condições para as indústrias investirem com segurança jurídica, fiscal e regulatória na área. E trabalhamos com Ciência, Pesquisa e Validação, levando aos produtores a segurança das tecnologias. Isso, obviamente, mostrou o que sabemos. E o Brasil é líder e vai ser cada vez mais. Temos todos os climas, solos, desafios diários, anos totalmente distintos um dos outros. Isso motiva o conhecimento e a pesquisa das empresas. Promove o crescimento da Agricultura. Essa tecnologia contribui muito para isso. É manejo novo do solo. Essas tecnologias transformam o setor em competição. E isso porque não temos eficiência igual em portos, transportes, logística como outros países.

AgroRevenda – E o nosso eterno desafio com a demora na aprovação de novas tecnologias?
Clorialdo Roberto Levrero – É mais um dos gargalos a serem trabalhados. Mas a questão é mais rápida no caso dos biológicos. Agora, temos que trabalhar melhor isso. Passo a passo. Qual é o entrave, qual o problema, porque demora tanto. Como a tendência dos biológicos está dando garantia, resultados, tem critério mais prático. Mas temos que trabalhar o tema. Os riscos, a questão das patentes. Temos que por a mão na ferida. Com consenso. Existe a cobrança: porque o Brasil usa a molécula tal? Porque não temos a segunda opção, que lá fora está disponível. E aqui não está. Por causa de um processo moroso. É um senso e contrassenso que precisamos entender. Será que lá é tão flexível assim em questão de registro? E aqui, o que dá para fazer? Precisamos copiar as coisas boas, por a mão na cumbuca e saber o que vai sair.

AgroRevenda – O segmento teve uma boa performance em 2024?
Clorialdo Roberto Levrero – Pelas nossas análises, são várias métricas para medirmos. Mensais, trimestrais, cada uma puxa um ponto de investimento, inadimplência, expectativa e mercado. Mas vai ser positivo, certamente, mesmo com problemas climáticos. O crescimento deve fechar próximo à nossa média, que em 2023 atingiu R$ 22 bilhões. Em 2024, vai crescer um pouco. O valor varia muito por causa de produtos muito valorizados, que acabam mascarando o crescimento. Já em volume não e vamos evoluir dois dígitos, com certeza. Os nossos volumes estão surpreendendo e chegando a 25% do mercado. Surpreendendo muita gente porque são muito expressivos.

AgroRevenda – E o panorama futuro? Terá muita gente entrando no setor ou já chegou ao limite?
Clorialdo Roberto Levrero – Acho que vai crescer bastante. Acompanhamos grandes indústrias de produtos convencionais abrindo portfólio, comprando empresas que industrializam esse tipo de produto ou inovando nas suas plantas, entrando forte neste mercado. Não enxergo quem não esteja no jogo. Em algum tipo de tecnologia elas estão entrando e a maior parte está se associando à gente. São nomes globais, líderes em diversos segmentos convencionais. É um caminho sem volta.

AgroRevenda – Houve relutância?
Clorialdo Roberto Levrero – A Abisolo Olhe, não há quem não tenha uma zona de conforto. Ser um grande player, que fornece para vários países e é líder mundial é muito bom. Agora, quando você efetivamente enxerga novidades que podem competir contigo ou ser um nicho interessante, lucrativo, bom para investir, isso traz esse pessoal. Todas as empresas estão entrando. E estão certas. Temos que ofertar sem parar ao agricultor. Caso contrário, não vamos conseguir produzir. O ambiente tropical é dinâmico demais, as pragas evoluem, várias doenças. Precisamos pesquisar e lançar novas tecnologias constantemente. Há cinco anos, ninguém pensava em trabalhar em produtos para reduzir estresse hídrico, reter água no solo, nas estufas de legumes e verduras ninguém usava água da chuva. Hoje em dia, temos que nos atualizar direto. E são conhecimentos sabidos há tempos, mas não colocamos em prática porque tínhamos alternativas. Mas agora é um mundo moderno, de reaproveitamento de insumos e fontes alternativas de energia, como a solar, os dejetos, a palha, etc. Transformação cada vez mais rápida.

AgroRevenda – Todas as culturas estão engajadas neste ‘novo mundo’?
Clorialdo Roberto Levrero – As frutas, os legumes e as verduras foram os grandes pioneiros. Hoje, a cana-de-açúcar é um grande exemplo de adoção. Temos observado nas nossas pesquisas. Não era comum observar o uso de biológicos nos canaviais, mas a realidade está mudando velozmente. A cana ficou estagnada em produtividade e percebeu a economia que pode haver na produção industrial. São tecnologias que fazem muita diferença na eficiência, nos resultados em cana e açúcar, na qualidade dos produtos.

AgroRevenda – O que você tem na cabeça agora, na Abisolo, depois da aprovação da lei dos biológicos, e na sua vida?
Clorialdo Roberto Levrero – Eu posso dizer que fiz tudo o que gostei. E agora é hora de consolidar o que começamos. Iniciamos em um segmento que acreditávamos ser muito importante para o Brasil. E estamos deixando algo para as próximas gerações. Trabalhar em insumos para uma agricultura mais sustentável, para as gerações que vêm pela frente. Parar de copiar a realidade de outros países e erguer a nossa realidade. Minha ideia é continuar, deixar um legado mais estruturado possível para esse segmento ser cada vez mais forte. Trabalhar não para nós, mas para a sociedade, os filhos e netos. Trazendo mais alimentos, paz e união. O nosso papel é a segurança alimentar, pois, se faltar comida, não tem organização que segura nada. Seguir em frente. Não inventar a roda.

AgroRevenda – A Abisolo apoiou a cobertura das Plataformas Programa Carlão, AgroRevenda e Publique AgroAgência durante a COP 29, no Azerbaijão. Por que?
Clorialdo Roberto Levrero – Nós consideramos muito importante mostrar ao mundo tudo o que fazemos de bom aqui no Brasil. 2024 foi um ano desafiador e o setor tem mostrado a competência necessária, sempre. Assim, estaremos ao lado de quem leva comunicação correta e construtiva sobre tudo o que realizamos, como o Grupo Publique desempenha sempre.

AgroRevenda – A partir de agora, qual é o papel das tecnologias dos produtos químicos?
Clorialdo Roberto Levrero – Vai continuar sendo importante. Nem tudo vai ser possível ser substituído. Temos que pensar nas soluções biológicas como complementares, o que depende da variedade das condições da agricultura brasileira. A palavra chave não é substituição e sim sinergia. Andando juntas. Prova disso é que as grandes corporações estão começando a pesquisar e utilizar as novas tecnologias, mirando sempre a eficiência.

AgroRevenda – O que vem pela frente?
Clorialdo Roberto Levrero – Nosso setor é muito pulverizado. Representamos 70% do mercado e não temos nenhuma área onde não tenhamos pelo menos 50%. A lição de casa é continuar fazendo bem feito o que tem sido feito até agora. Nossas indústrias enfrentaram nos últimos quatro anos pandemia, guerras, problemas climáticos, câmbio valorizado, preços baixos, atuando muito em cima de planejamento, pesquisa, gestão e capacitação. É só sermos cada vez mais assertivos nesse caminho.

AgroRevenda – E os projetos classistas da associação?
Clorialdo Roberto Levrero – Nós temos a Academia do solo, que trabalha as pesquisas, as revisões bibliográficas, atualizando e validando todas as tecnologias para quem quiser acessar as informações. Ainda publicamos livros e o tradicional Anuário Brasileiro de Tecnologia e Nutrição Vegetal, em todo início de temporada, com cenários, dados de mercado, informações e tudo o que a gente representa.

AgroRevenda – Já foi produtor rural?
Clorialdo Roberto Levrero – Sim.

AgroRevenda – Não é mais?
Clorialdo Roberto Levrero – Não. Não dá tempo (rssss!).

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