Conferência destaca políticas públicas para biocombustíveis

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Encontro internacional debate qual é o papel de políticas públicas para o mundo chegar à neutralidade em suas emissões de carbono. Brasil é considerado uma potência em bioenergia.

 

Qual é o papel da bioenergia? E, se onde a biomassa é limitada, quais seriam as políticas públicas para priorizar o seu uso? Com essas perguntas, Dina Bacovsky, chair do Programa de Colaboração Tecnológica do IEA Bioenergy e líder do Bioenergy and Sustainable Technologies (BEST), da Áustria, abriu o primeiro painel de políticas públicas da BBEST – IEA Bioenergy Conference. O evento foi iniciado no dia 22 e será encerrado hoje, em São Paulo.

Tendo em vista que será necessário que biocombustíveis e a bioenergia contribuam com ao menos 20% do total da energia usada em 2050 para o mundo chegar à neutralidade de emissões prevista para 2050, Jeremy Moorhouse, analista de Bioenergia da Agência Internacional de Energia (IEA), alertou para as muitas vantagens da bioenergia. Segundo o analista, elas vão muito além da redução de emissões: a energia de base biológica é acessível, é uma fonte segura, é barata e compatível com as diferentes tecnologias que demandam energia. Melhor ainda: não pressiona o uso da terra voltada ao cultivo de plantações. “Há território suficiente para a adoção de políticas públicas voltadas ao crescimento da bioenergia”, garantiu.

Contudo, ressaltou Moorhouse, no que se refere à transição energética, duas áreas são críticas e devem ser priorizadas para uso voltado à bioenergia, áreas estas que não contam ainda com outra solução: aviação (Sustainable Aviantion Fuels – SAF) e marítimo (biobunker). Para as demais, diz Moorhouse, há outras soluções e a elas cabem uma combinação de políticas, biocombustíveis líquidos, hidrogênio e eletricidade, conforme o melhor custo obtido em cada caso.

Brasil na liderança – A bioenergia no mundo, informa o analista da IEA, já representa 7% do consumo de energia. A América Latina lidera o consumo de bioenergia, com 30% proveniente de fontes biológicas. Já, o Brasil, diz ele, é uma verdadeira potência nesse quesito, chegando a perto de 40%. Moorehouse elogiou o programa Combustível do Futuro brasileiro e sua legislação que busca incentivar a captura de carbono. “Queremos ver isso se repetir em outras partes do mundo”, defendeu. Da mesma forma, citou a iniciativa brasileira à frente da presidência do G20, buscando a construção de um consenso para acelerar e implementar políticas de biocombustíveis.

Marlon Arraes Jardim Leal (foto à esquerda), diretor do Departamento de Biocombustíveis do Ministério de Minas e Energia (MME), por sua vez, frisou que devemos levar em conta os 2 bilhões de motores que hoje demandam combustíveis líquidos. “Como vamos descarbonizar esse universo?”, questionou. A boa notícia, frisou, diz respeito aos investimentos de energia x bioenergia feitos pelo mundo. Se em 2018 o planeta investia US$ 1 trilhão tanto em energias convencionais como em bioenergias, em 2024, dos US$ 3 trilhões investidos em energias, US$ 2 trilhões são para as tecnologias de energias limpas e sua infraestrutura.

Nesse contexto, defende o diretor do MME, a contabilidade de carbono das várias fontes de energia se torna uma peça-chave para as políticas de descarbonização. A questão, lembrou, foi discutida em nível ministerial no G20. Nesse fórum, uma grande conquista será a declaração conjunta dos países presentes, a ser publicada em breve, indicando que essa contabilidade deve ser neutra em relação às tecnologias a serem adotadas. Deve, ainda, trazer uma abordagem inclusiva para implementar uma ampla variedade de combustíveis sustentáveis e suas tecnologias.

Bioenergia à base de madeira – Paul Bennett, da Scion Research da Nova Zelândia fez um rápido balanço das políticas energéticas daquele país. “Basicamente, em nosso país há um esforço para descontinuar o uso de carvão. No entanto, não há lá, como no Brasil, uma estratégia de energia para combustíveis líquidos ou para o biogás”, admitiu. “Precisamos aprender com o que o restante do mundo já está fazendo”, defendeu.

De acordo com Bennett, boa parte da biomassa neozelandesa está baseada em agroflorestas, que hoje ocupam 8% da terra do país. “A nossa bioenergia, basicamente, é à base de madeira”, relatou. Ele defendeu a adoção intensiva de serragem e resíduos de madeira dessa cadeia para serem revertidos em bioenergia. “É preciso mobilizar todo esse material que está sendo desperdiçado”, recomendou.

Uso mais efetivo – Daniela Thrän, da UFZ (Helmholtz – Centre for Environmental Research), da Alemanha, e líder da força tarefa 44 da IEA Bioenergy, levantou outro ponto: como as políticas públicas podem apoiar a implementação da energia sustentável, de forma a garantir que o seu uso seja mais efetivo. Segundo ela, já são mais de 60 os países que estão em busca de políticas em prol da bioeconomia. Essas estratégias normalmente combinam regulação, promoção e políticas de comunicação com graus de intensidade variados. “No entanto, conforme o país, há diferentes entendimentos sobre o que é a bioeconomia”, ressaltou.

Para a especialista, em todos os casos, as estratégias dos países indicam uma crescente demanda por biomassa para vários setores, entre os quais biocombustíveis, construção civil, indústria química, plásticos e outros. “Ou seja, temos que usar sabiamente a biomassa disponível. E aplicar os conceitos de bioeconomia circular, usando os materiais e produtos pelo maior tempo possível”, recomendou. Também sugeriu que o uso do lixo e de resíduos deva ser levado em conta para acelerar a bioeconomia, principalmente onde não é possível a adoção das energias limpas como a solar e a eólica.

Casas aquecidas – Christian Rakos (foto à direita), presidente da Associação Mundial de Bioenergia (WBA), preferiu lançar um questionamento. “Seria o uso mais eficiente da biomassa em termos de mitigação de gases de efeito de estufa, ou para dar conta dos serviços essenciais para as pessoas?”, indagou. Para ele, há questões – como manter as casas aquecidas no inverno – que são fundamentais.

Rakos lembrou que boa parte da população mundial – 2 bilhões de pessoas – ainda queima biomassa para poder preparar seus alimentos. Esse montante corresponde a 40% da biomassa do mundo. “Esse não é um uso sustentável, pois traz sérios impactos à saúde das pessoas, devido à inalação de fumaça”, pontuou. No entanto, para essas pessoas não é possível o acesso econômico ao gás de cozinha. “As nossas políticas devem levar em conta essa realidade e direcionar incentivos – créditos de carbono e a criação de mercados de carbono – para o que realmente é essencial às pessoas.”

Rakos também citou o índice alarmante de desinformação, em um nível jamais visto antes, contra as políticas em prol da bioenergia na Europa. “Vimos uma campanha de US$ 1,2 bilhão direcionada à desinformação contra a bioenergia, contra os acordos feitos na União Europeia”, denunciou. “E os SAFs poderão facilmente ser arrastados para a lama também. Quem não quer ver os seus combustíveis fósseis prejudicados poderá colocar muito dinheiro nisso”, concluiu.

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