Tirso de Salles Meirelles: “O Agro Paulista nada deve às economias desenvolvidas do mundo”

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Não dá outra. Quando a gente cruza o olhar com esse paulistano criado no norte do Estado, nas quentes cidades de Franca, Ribeirão Preto e Sertãozinho, o resultado é sempre o mesmo: um sorriso largo, radiante e permanente. Tirso Meirelles é filho de uma lenda do agronegócio paulista e brasileiro, Fábio de Salles Meirelles, um dos maiores líderes na história do segmento. E um enlouquecido pelo trabalho. Economista, Administrador de Empresas, Jornalista, Agropecuarista, especialista em Administração de Empresas e em Políticas Públicas. Presidiu o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de São Paulo (SEBRAE – SP) e ocupou a vice-presidência da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural de São Paulo (SENAR-SP). Gosta de frisar que defende o produtor rural porque é ele que sustenta o Brasil. E não titubeia para listar tudo de que o lavrador e o pecuarista precisam: melhoria da renda, apoio aos pequenos negócios, menos impostos, ajuda na adequação ambiental e crédito mais simples e barato.

Em fevereiro deste ano, assumiu a presidência da FAESP (período 2024 – 2027), uma entidade de um estado simbólico, conhecido pela força da Indústria, mas com história cravada no país pela força do agro do café, da cana e da pecuária bovina. E caminho de mais de duzentos anos de muita pesquisa. Tirso substitui o próprio pai, que comandou a federação durante cinco décadas e é uma marca forte na vida e no trabalho do filho. Tanto que serviu de inspiração para o livro ‘Fábio Meirelles – Semeador de Novos Tempos’. Mas o filho não fica só na admiração paterna. Pega pesado  no trabalho. Mantém contato permanente com o governo do estado de São Paulo, a Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, prefeituras e câmaras municipais, além de entidades de classe,  na criação de planos e metas.

Durante a pandemia da Covid-19, percorreu o estado inteiro para fortalecer as cadeias produtivas e garantir o abastecimento de alimentação ao estado paulista. Não tira da mente quais ações são fundamentais: parcerias com lideranças locais e prefeituras em projetos diferenciados, que promovam o desenvolvimento regional, os arranjos produtivos, o turismo rural e religioso, a gastronomia, a economia criativa, as compras públicas e uma série de medidas implantadas a partir da união de esforços. O olhar atento às necessidades do agronegócio, capaz de conectar pessoas, conhecimentos e recursos. Neste ano, Tirso Meirelles inicia um novo caminho. Está abrindo as portas da federação para a sociedade conhecer como funciona e atua a entidade em defesa dos pequenos e médios produtores paulistas. Comanda a criação de dois novos centros de pesquisa, pisa no acelerador da digitalização e no levantamento e difusão de dados aos associados. A ideia é que o agro paulista produza mais, melhor, exporte, fature, explore tudo o  que tem no local, ajude os municípios e fortaleça a presença do agricultor e pecuarista no campo. Tirso Meirelles recebeu a Plataforma AgroRevenda com exclusividade, para uma conversa franca na sede da entidade, no centro histórico da capital paulista. E falou porque sua presidência na FAESP vai ser marcada por uma paixão que aprendeu com a bisavó, a mãe e o pai. O Agro. Acompanhe.

AgroRevenda – Obrigado por receber a gente e oferecer a chance de sermos a primeira entrevista sua, aqui na sede da FAESP.
Tirso Meirelles – A honra é toda minha em receber os negócios de comunicação do Grupo Publique, que são uma referência de qualidade em informação correta do agronegócio, levando os conteúdos de que os produtores tanto necessitam. Estamos aqui na Federação sempre com a inspiração do nosso eterno Presidente Fábio Meirelles. Fizemos um Conselho Superior do Agronegócio aqui, que vai passar as maiores diretrizes para ‘grandes cabeças’ capacitadas e, assim, fazermos o melhor pelo segmento. Para o fortalecimento do pequeno e médio produtor, na transformação  digital que estamos vivendo. Estamos lançando o Centro de Excelência na Cana de Açúcar, que vai ser construído em Ribeirão Preto, com 5.000 metros quadrados para trabalhar a tecnologia da cultura e do nitrogênio. E o Centro de Excelência em Big Data, bioinsumos e Inteligência Artificial, em São Roque, onde vamos erguer uma escola de 7.500 metros quadrados voltada para o  pequeno e médio homem do campo.

AgroRevenda – Como foi aprender sobre Agro na própria família?
Tirso Meirelles – Sou paulistano e vivi em Franca, na roça. Meu pai saiu cedo da região e foi presidir o Banco Nacional de Crédito Cooperativo, no Rio de Janeiro. Minha mãe era professora e aprendeu tudo sobre a cultura agropecuária com meu avô. E transmitiu para mim. Depois de conhecer todas as atividades rurais, voltei à Capital para estudar e acompanhar o Doutor Fábio, com dezessete anos. Fazia o curso de Economia e trabalhava. E fui conhecendo centenas de amigos de meu pai, que eram produtores, presidentes de sindicatos rurais. Foi uma vivência muito rica, com gente que sabia mais do que eu, tinha uma cultura mais avançada do que a minha pelo dia a dia, pelo conhecimento, pela experiência.

AgroRevenda – Então?
Tirso Meirelles – O Doutor Fábio me pediu para representá-lo quando necessário. E comecei a aprender a me comportar em todos os ambientes que frequentava em nome do Agro Paulista.  Sabendo da importância de todos e de todos os espaços quando você fala em nome de um outro alguém.

AgroRevenda – Por que depois voltar ao interior?
Tirso Meirelles – Para trabalhar nas nossas atividades de cana e pecuária de corte. Casei, morei em Sertãozinho e Ribeirão Preto, tivemos dois filhos. E passei a ter um ‘segundo pai’, Antonio Eduardo Tonielo (‘Toninho’, uma referência do setor bioenergético brasileiro). Atuamos juntos durante 21 anos. Fomos importantes um para o outro, participamos de várias atividades políticas, resgatamos o processo da Fenasucro (maior feira de bioenergia do Brasil, realizada em Sertãozinho – SP).

AgroRevenda – Aí, nova volta à Capital?
Tirso Meirelles – Sim, para assessorar o Dr. Fábio no Sebrae, nos anos 2000. Quando eu ia voltar ao interior, recebi um convite para assessorar o Alencar Burti, presidente da Associação Comercial do Estado de São Paulo. Foram quatro anos de trabalho. Nisso, já estava afastado da Federação porque estava voltando ao interior. Mas o Paulo Skaf assumiu o Sebrae e me chamou para uma nova assessoria . E veio junto o convite para estar junto da presidência da Federação. Depois, fomos eleitos presidente do Sebrae e foram mais quatro anos. E, hoje, deixamos o Manuel Henrique, vice-presidente da Federação do Comércio (Fecomércio), num magnífico trabalho com a cadeia produtiva. E, ainda, nesse intervalo, atuei no Conselho Nacional de Pecuária de Corte, do meu amigo Sebastião Guedes, um profissional de alto calibre. Que ajudou demais a agropecuária deste país. E vem auxiliando o setor no trabalho da retirada da vacinação obrigatória do rebanho
bovino contra a febre aftosa, com um olhar para os outros países da América do Sul e América Central. Como já foi feito no Estado de São Paulo.

AgroRevenda – Quem é o Doutor Fábio para você? Como foi trabalhar com o seu pai?
Tirso Meirelles – Na realidade, é uma profunda questão de respeito. Eu peço a benção do meu pai e da minha mãe até hoje. Quando você tem uma atividade próxima a uma autoridade, você precisa respeitar mais ainda. Não dá para eu me permitir chamar de pai ou ouvir alguém falar ‘seu pai’. Convivi demais com o Doutor Fábio. Ele tem uma visão humanitária, de ajudar o produtor rural brasileiro, ele nunca tirou férias. Quando fui escrever o livro sobre ele, achei que sabia o suficiente sobre a vida dele. Fiz todas as entrevistas e agradeço demais por passar a conhecer bem o meu pai ainda vivo. Todos devem aprender muito com as pessoas que amam, saber do aprendizado delas e das atividades realizadas com amor. Temos que fazer o melhor possível no dia de hoje e cuidar bem ‘dos seus’.

AgroRevenda – Qual foi a intenção de escrever um livro sobre seu pai?
Tirso Meirelles – O Doutor Fábio sempre pensou muito na comunidade. Lembro-me de duas histórias. Um cacique indígena que procurou a ajuda dele e ficou tão satisfeito com os conselhos recebidos que fez uma homenagem dando o nome dele ao filho. Foi a prova do lema de pregar sobre a unidade e a importância dos acordos necessários para se respeitar todos os processos. É o ponto do semeador. Outro fato foi quando ele conseguiu dezenas de ambulâncias e equipes que foram distribuídas para ajudar os sindicatos rurais e os produtores. Ele sempre pensou na vida dos trabalhadores. Gente que convivia com a gente, produzia ao nosso lado. O primeiro acordo coletivo do Brasil ocorreu aqui, quando o então economista do Departamento Econômica da Federação era Delfim Neto, que aplicou parte do que aprendeu aqui quando foi Ministro da Agricultura. O Doutor Fábio tem mais de 130 títulos de cidadão honorário. Uma retribuição de várias cidades a ele, que sempre fez seu trabalho sem nunca pedir nada em troca. Existe uma história de irmandade por trás da criação de um sindicato rural. Ele preocupava-se com cada um e tinha uma imensa sensibilidade para perceber quem precisava de ajuda. É a lição que aprendi: se você assumir um cargo, assuma com vigor. E saiba que o berço de tudo é o município. Onde é necessário ajudar os necessitados, fazer promoções locais, amparar os mais necessitados.

AgroRevenda – Que legado o Doutor Fábio deixa e qual a sua principal missão na FAESP?
Tirso Meirelles – É uma responsabilidade gigantesca. Principalmente pelo legado fantástico que recebi. De todos os parceiros construtores ao lado do Doutor Fábio. Que ajudaram neste crescimento. Nosso trabalho é municipalista, estamos em cada canto do Estado, ao lado do SENAR, com big data, bioinsumos, o avanço da irrigação em São Paulo, com a agricultura que preserva a água, fazendo todas as inovações tecnológicas. E já falei com o Governador Tarcísio de Freitas para levar as inovações para todo canto. Quero estar ao lado do agricultor do futuro, quase 10 mil jovens, as mulheres, que fazem um trabalho importante, de independência, atuando em todo o processo da economia criativa. Sem falar do turismo rural porque temos uma vasta região e  precisamos atuar ao lado dos pequenos, com atividades oferecidas aos clientes em passeios de cavalos, artesanato, gastronomia, lazer e descanso. É fantástico. E tudo ao lado do cooperativismo, de todas as entidades do segmento, criando a sustentabilidade e mostrando ao mundo que a nossa produção é a mais sustentável do planeta. E o pequeno pode agregar valor nas pequenas indústrias. Com apoio do Secretário Estadual de Agricultura do Estado de São Paulo e do Vice-Presidente da República. Chegando à meta da produção total, mantendo o homem no campo. As cidades,  notadamente as pequenas, fortalecem a riqueza e a produção das pessoas.

AgroRevenda – Por falar nisso, a Federação realizou um trabalho social bem profundo durante a pandemia da Covid-19, não?
Tirso Meirelles – 2020 até 2022 foram três anos complexos. Na pandemia, fecharam todos os mercados e tivemos que criar mecanismos para ajudar os produtores, principalmente de  hortifrutigranjeiros. Depois, operamos com as áreas de flores, cana e álcool. E abastecer os consumidores. Distribuímos quatro milhões de máscaras, em parceria com a Fiocruz, realizamos mais  de quinhentas mil testagens porque o agro não podia parar e distribuímos alimentos para famílias com dificuldades financeiras. E foi um sucesso, ação conjunta que envolveu milhares de pessoas. Sem falar no avanço da transformação digital para eles conseguirem vender os seus produtos. Só na metade de 2022 é que começamos a realizar a retomada.

AgroRevenda – A FAESP realizou neste ano o ‘Fórum FAESP de Imprensa do Agronegócio’, com jornalistas do estado inteiro para mostrar como atua e funciona. Como foi a experiência?
Tirso Meirelles – Vivemos um novo momento. A imprensa é muito importante para acompanhar, conhecer e comunicar todos os desafios que te mos pela frente. A sustentabilidade, que é fundamental, inovação e tecnologia. Por isso estamos erguendo dois novos centros. Para o pequeno e médio produtor poder trabalhar e ter renda. Além de nos concentrarmos nas pequenas indústrias para agregarmos valor às mercadorias. Sem falar no turismo rural, para você usar a aptidão natural do local e transformar em atividade produtiva para o município desenvolver-se.
Mostrar ao produtor que ele e a cidade produzem com sustentabilidade. 66% do nosso território brasileiro são preservados. Agricultura e pecuária utilizam perto de 25%. E o mundo utiliza muito mais, quase a metade em várias nações importantes na produção agropecuária. É nisso tudo que vamos trabalhar.

AgroRevenda – Depois de assumir a presidência, você citou a criação de uma nova frente. Como é isso?
Tirso Meirelles – Precisamos de uma Frente Nacional do Agronegócio no Brasil. Hoje, a Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) tem capitaneado essa iniciativa, junto com várias entidades, como a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Frente Brasileira do Agronegócio (FPA), Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG), o Instituto Pensar Agropecuária (IPA), a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (APROSOJA), dentre outras. Entretanto, é necessário mais. Todos permanecendo juntos em novas lutas. Para criarmos a sustentabilidade de que precisamos. Temos o Código Mineral, precisamos avançar na produção de fertilizantes, pois importamos quase 90% de tudo o que usamos no solo . Temos isso no país e precisamos fortalecer a cadeia produtiva, ajudando o agro, o comércio e os serviços.

AgroRevenda – Durante o ‘Fórum FAESP’, foi destacado mais um serviço para o setor que é o banco de dados da Federação. Como isso vem sendo construído?
Tirso Meirelles – É um trabalho fenomenal que estamos realizando. E que está à disposição de todos, basta entrar em nosso portal. Temos uma equipe de doze pessoas só trabalhando no estudo dos dados, com toda uma inteligência artificial que, mais tarde, vai ser transportada para o centro de São Roque. Tudo para amparar decisões e ajudar os produtores menos assistidos a terem um horizonte de negócios e lucros que mantenha sua atividade, sua família e sua presença no campo.

AgroRevenda – O dinheiro disponibilizado pelo setor público é suficiente para atender o setor?
Tirso Meirelles – Os recursos destinados aos pequenos e médios produtores do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor (Pronamp), assim como os de outras linhas de crédito, não atendem à demanda total e muitos produtores têm de recorrer ao mercado financeiro regular. nossa tarefa é sempre lutar para que os recursos sejam maiores. Afinal, o seguro rural é um dos principais instrumentos da política agrícola. E os produtores operam sem parar com riscos diversos. Seca, geada, chuva em excesso, preços baixos, juros, etc.

AgroRevenda – A agropecuária paulista está posicionada entre as maiores e mais eficientes do planeta?
Tirso Meirelles – A agropecuária paulista nada deve às mais eficientes do planeta, seja dos Estados Unidos, da Europa Ocidental ou Austrália. O sistema FAESP/SENAR-SP trabalha incansavelmente para manter ou até ampliar esse padrão. E, para isso, é fundamental estreitar relações com os produtores e colaboradores do setor, ouvindo suas demandas e buscando soluções conjuntas. O sistema FAESP/SENAR busca ofertar os cursos mais atualizados quanto às necessidades de um mercado cada vez mais competitivo e complexo. A questão da infraestrutura e do escoamento da produção também é prioritária para nós.

AgroRevenda – Qual o papel da educação no processo de sustentabilidade do País?
Tirso Meirelles – Sou muito grato pelo exemplo dado pela minha mãe e minha avó nesse sentido. A vovó Georgina alfabetizava os trabalhadores rurais e seus filhos na escola que mantinha na fazenda. Não há outro caminho que não seja o investimento em educação. E neste momento tão peculiar, em educação empreendedora, porque é ela que vai preparar crianças, jovens e adultos não somente para adaptar-se ao mundo novo, mas para ser protagonistas de suas jornadas de vida, inclusive profissional.

AgroRevenda – Quais as principais lições que o senhor tirou ao comandar o Sebrae?
Tirso Meirelles – Os pequenos negócios têm um papel fundamental na sociedade. São reconhecidamente o colchão social, com geração de empregos e distribuição de renda. É ali que está a primeira oportunidade de ocupação, onde está o primeiro passo para se realizar um dos principais sonhos do brasileiro: ser o próprio patrão. Em São Paulo, são milhões de microempreendedores individuais, micro e pequenas empresas de serviços, comércio, indústria e construção civil. E o Estado representa 1/3 do total de pequenos negócios presentes em todo território nacional. Os números são expressivos, mas a esmagadora maioria desses empreendimentos foi aberta por conta de uma necessidade, ter ou complementar rapidamente a renda, o que traz fragilidades para o processo. Mas é necessário haver um ambiente plenamente favorável para crescer e se consolidar. O maior pilar de entidades como o Sebrae é dar sustentabilidade aos negócios a longo prazo.

AgroRevenda – Como você projeta o empreendedorismo no Brasil no futuro?
Tirso Meirelles – Em quase meio século, assistimos e provocamos diversas mudanças. As pequenas empresas ganharam visibilidade, sua representatividade foi reconhecida, o empreendedorismo entrou na pauta das políticas públicas. Mas o Brasil precisa ser um país em que empreender seja a escolha natural para atividade profissional. Empreendedores fortes, que
realizam seus sonhos, são protagonistas em suas áreas de atuação.

AgroRevenda – Qual o futuro do Agro Paulista?
Tirso Meirelles – Competir com os maiores mercados, incluindo a exportação. Por isso o empenho da FAESP | SENAR (SP) é qualificar o setor e disseminar boas práticas. Nosso agro paulista nada deve às economias mais desenvolvidas do mundo.

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